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Nascer em rede


Avatar Por Redação em 30/07/2018 - 00:00

Danilo Suassuna, mestre e doutor em Psicologia, idealizador do Instituto Suassuna. Foto: Divulgação

Daniela Martins

Ensine ao seu filho que se frustrar faz parte da vida. Parece óbvio? Não é. E ele precisa compreender isso antes de deixar as brincadeiras de rua e ingressar nas redes sociais. Sem uma preparação, esse contato pode ser perigoso. É o que explica o psicólogo Danilo Suassuna, mestre e doutor em Psicologia, idealizador do Instituto Suassuna.

Danilo Suassuna, mestre e doutor em
Psicologia, idealizador do Instituto
Suassuna.
Foto: Divulgação

A influência da tecnologia e internet no comportamento de crianças e jovens é um dos temas da 3ª Conferência Internacional sobre o Bem Estar Infantil, realizada pelo projeto De Umbiguinho a Umbigão, com o apoio do Suassuna, em setembro, na Capital. Nessa conversa, Danilo falou um pouco sobre a temática.

 

Tribuna do Planalto: Quais cuidados os pais devem ter com o uso das redes sociais pelos filhos?

Danilo Suassuna: Cuidados, alertas com os filhos, os pais devem ter a todo momento. A ausência dos pais na infância vai repercutir, de algum modo, lá na frente. O adolescente vai buscar um contato externo, um contato com alguém que o compreenda e o acolha. Temos falhado nesse sentido. A gente cobra muito do adolescente e esquece de acolher o que ele está sentindo, o que está pensando. Não significa que vamos parar de cobrar. Significa que tem um lado desse adolescente que a gente não está conseguindo enxergar. É o lado dos sentimentos, das sensações.

As redes sociais facilitam esse contato externo?

As pessoas estão em busca de ser aceitas, em busca de contato com outros seres humanos. Nesse contexto, é muito mais fácil um contato online. Tenho ali uma rede maior de contatos do que na rua, portanto, a possibilidade de ser aceito é maior. Essa maior probabilidade faz o adolescente ir atrás dos seus novos amigos. Hoje em dia, muita gente tem amigos virtuais, que, para eles, são reais.

É preciso dar mais atenção, pesquisar a influência das redes no comportamento de crianças e jovens?

Sim, merece pesquisa. Merece muita atenção, principalmente dos pais. Não adianta ter muita pesquisa de um lado, se os pais não se interessarem pelos filhos de outro. Pai e mãe realmente precisam entender que resolveram ser pais e, agora, vão ter de gastar tempo com seus filhos. A todo instante, essa criança gera uma demanda. Quando é pequenininho e não fala, a gente fica o dia inteiro olhando para saber o que a criança quer. O adolescente é do mesmo jeito. Ele está ali carente de atenção. Tem gente que pensa que depois dos 9, 10 anos, o filho não precisa mais de atenção. Pensa que já fez tudo o que poderia pelo seu filho. E não é bem assim.

O que acontece quando os jovens se deparam com uma vida real diferente daquela perfeita e sempre feliz das redes sociais?

Essa vida, essa realidade plástica, todos nós vivemos. Tem gente que está no hospital e posta uma foto linda em um parque de diversões. Quando o jovem se depara uma nova realidade, diferente daquelas dessas redes sociais, ele se assusta. Muitos se deprimem ao entrar em contato com esse mundo que, às vezes, é tão inóspito para ele. A sensação que eles têm é literalmente essa: ‘que mundo é esse que estou vivendo? Que sentido faz a vida se a vida for assim?’. Teoricamente, a vida nas redes sociais é muito bonita, muito legal de ser vivida. Ao passo que, quando esses meninos se deparam com o mundo real, entre aspas, eles se dão conta das frustrações, dos limites, das angústias. É nesse momento que aquilo que ensinamos lá na infância faz a diferença, a ideia de que a angústia move o ser humano. Quando brincava na rua, a gente lidava com o igual e o diferente. Na internet, a gente só busca o igual. Lidar com o diferente se torna muito complicado para essas crianças, o que pode levá-las à depressão, a ter pânico ou fobia social. Enfim, o nome da patologia não é o mais importante. A tentativa de compreender a dor dessa criança é o mais importante.

Nesse caso, como protege-las?

Não diria proteger, mas educar para que crianças e jovens entendam a dualidade da vida, os momentos felizes e os momentos tristes. Senão a gente vai dizer que os momentos felizes não existem. A gente pode incorrer nesse erro.

Como esclarecer que a realidade pode não ser essa das redes sociais?

Na verdade, eu não entraria por aí. A realidade das redes sociais existe para aquela pessoa que está lá. Em determinado momento, ela tirou aquela foto. O que a gente não pode encerrar na cabeça das crianças, dos adolescentes, é que aquela é a única realidade existente. Temos de mostrar que naquele momento uma pessoa está mostrando o lado positivo da vida dela, o que não quer dizer que a vida dessa pessoa seja daquele jeito o tempo todo.

Como preparar os filhos para viver as frustrações?

Começa por preparar os pais para entenderem que dizer ‘não’ é amar. Temos de demostrar para pais e filhos, para todo mundo, que quando digo não, estou dizendo um não com amor também. A gente prepara os filhos, os protege, mostrando para que a frustração faz parte da vida.

“A vida nas redes sociais é muito legal de ser vivida. Quando esses meninos se deparam com o mundo real, se dão conta das frustrações. É quando o que ensinamos lá na infância faz a diferença”

Qual o limite entre respeitar a privacidade e saber o que se passa com seu filho?

Se dou liberdade para meu filho me contar tudo que ele precisa, não preciso invadir o celular dele. Se a gente tem que invadir o celular, ficar investigando as coisas, significa que nós, pais, não temos essa habilidade de escutar o filho. Temos de saber falar com eles e, ao mesmo tempo, saber escutar. O problema é que as vezes a gente não escuta de forma integral. Escuta pelas metades. Se há algo que não queremos ouvir, a gente já briga com o adolescente, já diz que ele está errado. Não dá a possibilidade ao filho de entender porque está errado. Assim, ele vai precisar sempre de outro, que seja o pai, a mãe, para lhe dizer o que está errado e só terá de obedecer. A criança, o adolescente se perde nisso, porque não sabe mais qual é o rumo do certo, qual é o rumo do errado. Ele sempre precisa de alguém para lhe dizer isso. Agora, se converso e começo a mostrar para essas crianças que momentos de frustração são positivos. E aí, sim, de novo, mostro o lado positivo da angústia, eu consigo fazer com que elas aproveitem os momentos negativos na vida para fazer deles, momentos construtivos.

Mas muitos adolescentes costumam se fechar. Como transpor essa barreira?

Não podemos entrar no Banco Central, lá é um cofre fechado com um tesouro dentro. Se a criança se fechou, ela está protegendo alguma coisa. A gente tem que aprender a respeitar essas barreiras da criança. A partir do momento que a gente respeita essas barreiras, vamos conquistando ou reconquistando os nossos espaços. Se essa criança se fechou, nós deixamos de estar lá dentro, junto a esse tesouro. Fomos afastando desse tesouro, e o cofre do coração da criança foi se fechando. Não adianta querer transpor barreiras. O que a gente tem de fazer é conquistar essas crianças, conquistar a confiança no fato de que somos bons pais mesmo frustrando os filhos. Mostrar que eles podem confiar em você, pai e mãe, para que elas se abram vagarosamente. Não adianta querer reconquistar essa confiança do dia para a noite.

Assim como os filhos, muitos pais estão vivenciando a influência das redes sociais agora. Isso complica a situação?

As redes sociais existem para crianças, adolescentes e adultos. A gente tem que coexistir. Não adianta lutar contra. Preciso pensar em como ensino meu filho, o que o eduquei a ver o que na internet, a ir buscar o quê? É para da educação mostrar que as imperfeições fazem parte da vida. A partir do momento que a criança consegue perceber, como na figura do yin-yang, que tem negro no branco e tem branco no negro tem o branco, a gente começa a coexistir. A gente começa a existir com o outro, existir com as minhas dificuldades e existir também com as minhas benesses. Conseguimos unir essas duas coisas e ter uma sensação de humanidade. Isso traz uma naturalidade, uma leveza maior para a vida. Entendemos que a gente pode acertar, pode errar e que isso vai nos levar adiante.

 

 

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