Eleito com a promessa de resolver os problemas de Goiânia nos primeiros 100 dias, o prefeito Sandro Mabel (UB) priorizou saúde, educação e focou na reorganização da cidade e da máquina pública. Com discurso considerado autoritário em muitos momentos, o prefeito trabalhou para mostrar que Goiânia agora tem dono ou, no mínimo, um gerente, como ele gosta de se intitular.
Logo no início do mandato, Mabel publicou decretos para centralizar recursos, cortar gratificações, suspender pagamentos da gestão anterior e renegociar contratos. As medidas geraram críticas de sindicatos, que acusaram a gestão de caça às bruxas, especialmente após anunciar auditorias em afastamentos médicos e promover intervenções nos ambientes de trabalho com reorganização de espaços físicos.
Na saúde, assumiu o setor após uma grave crise nos últimos meses da gestão de Rogério Cruz (Solidariedade). Com articulação em Brasília e apoio do Governo de Goiás, que assumiu a regulação de 332 leitos de UTI, ele conseguiu normalizar temporariamente a regulação, mas, apesar do progresso, ainda enfrenta queixas permanentes na assistência.
Ainda em janeiro, conforme a prefeitura, implantou atendimento pediátrico 24h em todas as 13 unidades de urgência, mesmo que com clínicos gerais na linha de frente de algumas unidades e suporte remoto de pediatras via telemedicina.
Sandro realizou visitas frequentes às unidades de saúde, muitas vezes à noite, para fiscalizar atendimento, cobrar produtividade e orientar sobre o estoque de medicamentos. A situação da rede exigiu medidas emergenciais, como a abertura de novos leitos após mortes de pacientes à espera de UTI no período de Carnaval, e expansão da pediatria no Hospital e Maternidade Célia Câmara, sob um contrato reformulado com a Fundação de Apoio ao Hospital das Clínicas (Fundahc) em meio a ameaças de rompimento e contestações da entidade acerca dos valores pagos por partos.
A gestão também teve que lidar com dívida superior a R$ 330 milhões herdada da administração anterior com a administradora das maternidades e alguns hospitais filantrópicos, incluindo R$ 280 milhões para a Fundahc, R$ 40 milhões para o Hospital Araújo Jorge e R$ 13 milhões para a Santa Casa, além de dívidas com Hospital de Olhos e outras reivindicações, inclusive de fornecedores que cobram pagamentos atrasados estimados em mais de R$ 200 milhões. O valor total da dívida do Município supera os R$ 3,5 bilhões, conforme a interpretação da atual gestão.
Durante a transição, Mabel articulou R$ 30 milhões do governo federal, via senador Jorge Kajuru, para aliviar parte da dívida, e negociou parcelamentos com prestadores de serviços. Ainda assim, a falta de crédito dificulta a compra de insumos e medicamentos diretamente da indústria, conforme explicou o prefeito nesta semana, ao anunciar futuras reuniões com fornecedores para evitar intermediários e reduzir custos.
Na educação, o Chefe do Executivo afirmou ter identificado desperdício de recursos com o aluguel de galpões para armazenar itens inservíveis, que ele classificou como lixo, e determinou a devolução dos imóveis, economizando R$ 15 milhões anuais. Para ampliar rapidamente as vagas escolares, fechou convênios com instituições religiosas e expandiu unidades próprias, o que garantiu novas seis mil vagas.
A mobilidade foi outra frente de mudanças. Em sua primeira ação pública como prefeito, removeu um semáforo na Avenida Jamel Cecílio para melhorar o fluxo de veículos. Semanas depois, proibiu o estacionamento na via, gerando descontentamento entre comerciantes. Para minimizar impactos, permitiu a construção de vagas rotativas em parte do passeio e incentivou lojistas a fazerem convênios com estacionamentos privados na região.
A reestruturação viária incluiu a ampliação de direitas livres, liberação de faixas de ônibus para motos, a retirada de semáforos considerados desnecessários e a reinstalação dos sistemas de videomonitoramento após nove meses de inoperância. O prefeito chegou a prometer um novo sistema de Área Azul para 30 de março, o que não se concretizou.
Camelôs e mutirões
Outra meta para 30 de março, a desobstrução das áreas públicas por camelôs da Região da 44, foi mantida. Nesta semana, a Prefeitura de Goiânia intensificou as fiscalizações e o prefeito avisou que não tem recuo. Segundo a administração, a região ficará livre de trabalhadores ambulantes que poderão escolher entre a Feira Hippie ou uma das galerias disponíveis na região com valores intercalados a partir de diálogo feito pelo Paço com empresários.
Na limpeza urbana, intensificou mutirões e fiscalização de descartes irregulares, cobrando responsabilidade do Consórcio Limpa Gyn e da Comurg. Apesar de algumas abordagens duras contra pessoas mais humildes, consideradas desproporcionais, o resultado geral surtiu algum efeito e foi elogiado pelo governador Ronaldo Caiado (UB), que destacou a recuperação de uma “Goiânia encardida”.
Com o período chuvoso, Mabel entrou em campo para vencer dos buracos. Numa visita na Câmara no início de fevereiro, disse que iria empatar e projetou ganhar dos buracos em duas semanas. O Paço informou nesta semana ter fechado mais de 100 mil buracos no primeiro trimestre de 2025.
Mabel também teve uma agenda extensa de mutirões que buscava marcar os 100 dias com uma cidade limpa. Ele esteve na abertura destes eventos e, depois, fiscalizando os resultados de cima de um trio, semanalmente. Também projetou a demarcação de 20 pontos provisórios para despejo de entulhos e mobiliários.
Desgastes com segmentos marcam reorganização
A reorganização prometida como “choque de gestão” por Sandro Mabel envolveu cortes e auditorias. Mabel exonerou mais de 400 comissionados na Comurg, reduzindo R$ 6 milhões na folha, e suspendeu gratificações, gerando insatisfação entre servidores e gestores que reportam “desmotivação” das equipes.
Sindicatos acusam a gestão de perseguição após anúncio de auditorias nas licenças de afastamento, como as quatro mil da educação. Para auditar as licenças, Mabel contratou a Fieg por R$ 9 milhões, e comprou briga com cerca de 18 médicos que atuam na Junta Médica do Município.
Os primeiros 100 dias de Mabel também tiveram alguns arranhões na relação com uma Câmara Municipal acostumada a participar da administração. Chegou a dizer que não compareceria à Casa para prestar contas do último quadrimestre de Rogério Cruz, mas cedeu à pressão dos vereadores e cumpriu a agenda com discurso de terra arrasada.
Mais recente, o vazamento de uma minuta que visava a reduzir o porcentual das emendas impositivas gerou um novo trauma com a administração em uma pauta comum do parlamento e que nem mesmo a base está disposta a ceder. Nesta quarta-feira (2), o prefeito fez reunião com vereadores no Paço para acalmar os ânimos e garantir uma base firme.
Os vereadores também demonstram descontentamento com notícias que vêm sendo veiculadas na imprensa sobre execução das emendas e outros gastos da Casa, com parlamentares que sugerem o dedo do Paço nesta comunicação. Jornalistas reagiram a estas alegações enquanto o Paço descartou ter feito qualquer movimentação.
Nos próximos dias, Mabel entra em um momento mais pragmático, que o testará nas relações com os eleitores, com servidores, com vereadores e com os demais atores da cidade. Cem dias passam rápido, e o desafio agora é administrar os 1.360 que restam.