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“A indicação de técnicos para a prefeitura não prejudica o papel fiscalizador do vereador”


Andréia Bahia Por Andréia Bahia em 22/12/2024 - 00:00

Sabrina Garcez - vereadora (Republicanos)
Depois de dois mandatos como vereadora, Sabrina Garcez não foi reeleita para a Câmara Municipal e vai assumir a Secretaria de Governo na gestão de Sandro Mabel, um papel historicamente ocupado por homens. Uma pasta que faz a articulação entre os vereadores e a prefeitura, uma relação que ao longo do tempo é marcada por pressões dos parlamentares por cada vez mais espaços na administração municipal e tem como desafio tirar a prefeitura do cativeiro que a Câmara lhe impôs nos últimos anos. Sabrina traz para a nova gestão sua experiência na Casa e em relatar projetos controversos, como o Plano Diretor e o Código Tributário. Sabrina Garcez é advogada, formada em Direito pela PUC Goiás, com especialização em Direito Constitucional e Administrativo. Sua trajetória política começou no movimento estudantil, onde ajudou a criar o Passe Livre para os estudantes. Foi a primeira mulher a presidir a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara Municipal. 

ANDRÉIA BAHIA – Qual avaliação faz do fato de não ter sido reeleita? 

SABRINA GARCEZ – No processo eleitoral, quando se vai disputar uma eleição, é natural ganhar ou perder eleição. Eu aumentei a quantidade de votos da minha última eleição e tive mais votos que grande parte dos vereadores eleitos. Entendo que houve, por parte da população, aceitação do nosso projeto, a continuidade, mas eleição tem essas coisas, tem quociente eleitoral e uma série de outras variáveis que não é simplesmente o voto dado na urna; não é o voto absoluto. Temos que entender, respeitar esse processo e continuar trabalhando. Estar em um mandato não define a minha atuação política, nem as pautas que acredito nem se vou continuar trabalhando ou não em prol de tudo o que acredito.

A senhora relatou projetos controversos, Plano diretor, Código Tributário, Centraliza.  Essas discussões podem ter tido um impacto negativo na sua pretensão eleitoral, em 2024?

O parlamentar, o agente político, tem que ter coragem de assumir a responsabilidade de tomar decisões na sua cidade. Em todos os processos que relatei, tentei fazer da melhor maneira possível, com um amplo debate, ouvindo todas as pessoas. Plano Diretor, Código Tributário, Centraliza sempre foram projetos em que mantive um debate com a sociedade. E acredito que, por mais que tenha havido, principalmente em relação ao Código Tributário, uma discussão acerca do IPTU – e foi um erro da Prefeitura de lançamento, não foi um erro legal, porque na legislação tínhamos colocado uma trava de aumentar no máximo até 40% e na prática isso não existiu – mas eu entendo que as mudanças que Goiânia vai começar a ver a partir de agora são as mais importantes, elas que contribuem para a nossa cidade. Meu compromisso é com a cidade. Eu não faço política simplesmente de oba oba, mas política séria, política para resolver o problema das pessoas. Eu vou dar um exemplo claro sobre essa questão do imposto. Historicamente, até o Código Tributário ser revisto, a composição do IPTU para o orçamento da prefeitura era maior que do ISS, ou seja, se a prefeitura quisesse pensar em aumento de receita advinda de tributos, deveria pensar sempre em uma reformulação do IPTU. Enquanto eu acredito que deveríamos ter atividades econômicas fortes. O que tem que contribuir mais na composição do orçamento municipal é o ISS, não IPTU. E há dois anos o ISS é maior que o IPTU na nossa cidade. Isso é fruto da reforma que fizemos no Código e no Plano Diretor, que, com a questão da criação dos polos de desenvolvimento econômico; o próprio Centraliza só foi possível  pensar porque fizemos a reforma do Código Tributário. O que podemos experimentar de desenvolvimento econômico na nossa cidade só é possível graças à reforma tributária e ao Plano Diretor que relatei. São melhorias ou novidades que não fazem efeito na hora, imediatamente, mas a longo prazo. Daqui a 10 anos, vamos ver uma Goiânia muito mais desenvolvida, porque o cenário que havia era caótico, Goiânia estava perdendo importância dentro da região metropolitana, e conseguimos inverter essa roda, e Goiânia vai voltar a ser uma cidade pujante, de atividades econômicas, uma cidade industrial, nunca tivemos isso, uma cidade que gera emprego e renda e não só emprego, mas oportunidades de novos negócios para o empreendedores abrirem seus negócios na nossa cidade. Isso é fruto dessa atuação no  Código Tributário e no Plano Diretor.

A população não compreendeu os resultados do seu trabalho ou a interação com a população não funcionou como esperava?

Eu tive 6.039 votos, então eu entendo que houve um reconhecimento, que não foi o suficiente para garantir uma cadeira como vereadora, mas eu fui mais votada que grande parte dos vereadores eleitos e grande parte de todos que foram candidatos. 

Como você avalia a gestão atual da prefeitura de Goiânia?

O prefeito Rogério Cruz começou sob um forte rompimento da máquina pública, quando o MDB saiu da prefeitura, porque não saiu só o secretariado, mas toda máquina do MDB, que é uma máquina que faz bem a administração da prefeitura, que já estava ali há vários anos, que tinha uma experiência. E eu falo de tudo, desde tocar o processo nas gerências até as políticas públicas efetivas. Mas vejo que, principalmente neste último ano, o prefeito Rogério, com mudanças de secretariado e sem ter um projeto claro de cidade, cada secretário começou a ter sua importância e a ter um projeto pessoal e isso infelizmente fez muito mal para a cidade. Sem falar nos escândalos que foram descobertos e que precisamos observar e a Justiça fazer a sua parte. 

Por que os vereadores não perceberam o caos na saúde antes de a polícia intervir? 

Primeiro porque a polícia tem um processo de investigação muito mais robusto do que a Câmara, inclusive de apreensão de documentos e uma série de outros fatores que a Câmara não tem. A Câmara fez um trabalho e os vereadores também de procurar a prefeitura; eu mesmo falei com o prefeito falando dos repasses da Fundahc e das instituições conveniadas. Por várias vezes nós cobramos dele, solicitamos esclarecimentos,  pedimos informações. Mas o poder de polícia natural, apesar de a Câmara ter em um momento extremo de CEI, é do próprio aparato estadual, do Ministério Público e da polícia, de maneira geral. Eles têm mecanismos de averiguar mais rápido do que a Câmara.

Havia uma percepção de irregularidades nos contratos?

Havia uma percepção inclusive sentida pela própria população que nos procurava, relatando dificuldade de atendimento. Nós estivemos, em vários momentos, fazendo a intermediação com a prefeitura e essas instituições. Infelizmente, não tiveram resultado.

Por que a Comissão Especial de Investigação (CEI) da Comurg não conseguiu resolver os problemas da companhia?

Na verdade ela funcionou e trouxe à tona diversas denúncias que hoje estão sendo reafirmadas. O relatório da CEI apresentou alguns caminhos, que não foram cumpridos pela prefeitura de Goiânia, mas nós chegamos a um relatório. Eu não participei diretamente da comissão e não vou lembrar os detalhes, mas lembro que a CEI apresentou, por exemplo, a questão da folha de pagamento, as gratificações para as pessoas próximas do presidente, apontou a questão dos contratos e das emendas impositivas, que nunca se concretizaram ou se concretizaram de maneira incompleta. Tudo foi colocado no relatório da CEI e entendo que pode ser um embasamento para o que está sendo revelado com mais força agora.

A senhora tem dois mandatos de vereadora, passou por vários episódios de conflito entre a Câmara e a prefeitura. Isso deve ajudar na sua nova função como secretária de Governo na gestão do prefeito Sandro Mabel? Quais são suas principais metas e prioridades?

Nós vamos definir as metas com o prefeito, ele é o nosso grande gerente, e tem falado que a prefeitura mudou a gerência, então muda todo o ritmo de trabalho. Eu entendo que a minha proximidade e principalmente a minha vivência na Câmara pode facilitar essa interlocução com os vereadores. Eu entendo a importância dos vereadores, das suas bases, a importância das discussões que os vereadores trazem para a cidade e vou tentar fazer isso de uma maneira equilibrada, mostrando também a realidade da prefeitura para essa nova Câmara que foi eleita. Temos relatórios preliminares mostrando o caos que está a cidade, tanto é que o prefeito já disse que vai decretar calamidade tanto nas finanças quanto na saúde, estamos vendo o problema da educação, o déficit de vagas aumentando. Eu percebo que é preciso mostrar isso para os vereadores e trazê-los para as soluções que vamos apresentar. O prefeito Sandro tem experiência em gestão, já foi parlamentar, ele tem falado que, como parlamentar que foi, tem um respeito enorme pela Câmara, que adora vereador e, de fato, ele adora mesmo. Eu entendo que vamos ter uma relação equilibrada entre os poderes Executivo e Legislativo.

A participação de vereadores na administração, como sempre ocorreu, não prejudica o papel fiscalizador do legislativo?

O que o prefeito Sandro tem falado e que eu vejo em outros municípios é que a indicação de pessoas técnicas para prefeitura pode ser feita, não existe uma vedação, não existe uma ilegalidade, não existe uma irregularidade, mas cada poder tem o seu papel e sua Independência. Eu não vejo a indicação de alguém técnico para a prefeitura como prejudicial ao papel do vereador; o vereador tem que ter a maturidade de entender que o seu papel principal é justamente a legislação e a fiscalização. Agora, isso vai de cada vereadora, não posso falar de maneira geral. Mas entendo que se a pessoa é técnica e pode servir o município, não vejo que só porque ela conhece um vereador ou é próxima um vereador, deve ser impedida de ocupar um espaço. Quem vai perder a cidade com um quadro capacitado que vai deixar de estar lá simplesmente porque é próximo do vereador.

A indicação não inibe o vereador de cumprir seu papel de fiscalizar a prefeitura?

Não deveria.

Como romper essa relação com o Legislativo que deixa o Executivo refém dos vereadores nas votações de projetos de interesse da prefeitura? 

Eu acredito em um papel colaborativo entre o Poder Executivo e o Poder Legislativo, não nesse processo de ser refém. A política tem que ser assim, ela nasce com o papel de colaboração. Nós precisamos levar em consideração as demandas dos vereadores; eles estão na base, eles estão no bairro diariamente. Muitas vezes, as demandas que chegam até a prefeitura são através do vereador, deste contrato que o vereador tem com a base. Entendo que a prefeitura tem que ter esse olhar diferenciado para essas demandas que são trazidas, mas no sentido de colaboração, não é no sentido de fazer um refém do outro.

A manutenção do vereador Romário Policarpo na Presidência da Casa facilita a relação com a Câmara?

O presidente Policarpo demonstrou sua capacidade de diálogo e de articulação. Acho que foi natural a recondução do Policarpo, principalmente pelo que ele construiu internamente ao longo desses últimos três mandatos na Câmara. A Câmara sob a gestão do Policarpo deu um grande avanço para os vereadores, condições de trabalho e de estruturação; Policarpo é um presidente que escuta a demanda dos vereadores, que auxilia. Estou falando como uma vereadora que esteve com ele nesses últimos anos, é a minha experiência com ele. Por isso acho que foi natural a recondução dele. Acredito que a relação com a prefeitura será de colaboração, entendendo as necessidades da prefeitura, mas também de fazer a defesa dos vereadores, que é o que ele sempre fez.

Além da saúde e das finanças, quais são os maiores desafios que Goiânia enfrenta atualmente?

A educação, com toda a certeza, e o próprio prefeito tem colocado isso como prioridade, como meta para ele, e resolvendo os problemas aos poucos. Não temos uma vara para poder resolver tudo num primeiro momento, mas resolver aquilo que mexe com a saúde, com a vida das pessoas. É necessário que se tenha uma saúde que dê respostas, porque as pessoas estão ali, muitas vezes, correndo  risco de vida. E a educação das crianças; o prefeito Sandro tem falado sobre a importância das crianças estarem nos Cmeis, principalmente por conta da formação do cérebro dessa criança. Ela precisa estar bem atendida, bem nutrida e tudo isso ela pode encontrar dentro do ambiente do Cmei. Ele tem se preocupado muito com o humano, com a parte de de humanidade da nossa cidade. E as outras questões nós iremos resolvendo com o tempo.

Como você avalia a participação das mulheres na política? Quais medidas acredita serem necessárias para aumentar essa representatividade?

Isso é um processo histórico; primeiro foi negada a participação das mulheres na política e tivemos igualdade de fato com os homens com a redemocratização. Começamos muito mais tarde esse processo dentro da política. E o próprio histórico do país, um país machista e misógino, mas que, aos poucos, com a ajuda da legislação, temos mudado essa realidade. Em relação aos cargos parlamentares, eu defendo que tenhamos uma cota nas  cadeiras, e não como é a legislação hoje em relação à cota nas listas para as candidaturas. Mas acho que o Congresso tem trabalhado também e tenho certeza que a Justiça está tendo um papel fundamental nas decisões de investimento nas candidaturas femininas, nas de chapas que têm candidaturas laranjas. Tudo isso tem fortalecido a participação das mulheres, que avança na forma da representatividade muito lenta ainda. Por isso que eu entendo que precisamos partir para uma mudança do Código Eleitoral para que tenhamos no parlamento, pelo menos, cota nas cadeiras e não na lista de candidaturas.

Quais são seus planos para 2026?

Vou esperar chegar mais perto. Meu primeiro projeto é continuar contribuindo com Goiânia ao lado do prefeito Sandro, estou muito feliz com o convite e principalmente com a confiança do prefeito para ocupar uma secretaria tão importante como essa. E falando em representatividade feminina, é a primeira vez que uma mulher ocupa um espaço tão importante como esse, um espaço de articulação política que historicamente é dado aos homens. O prefeito Sandro já vem quebrando paradigmas comigo, com a chefe da Casa Civil, com a secretária da Casa Civil, secretária da Mulher, secretária de Assistência Social, todas secretarias fortes e de importância para as políticas públicas. Nesse momento, o meu foco é em atender bem a nossa cidade, estar à disposição da nossa cidade e sob o comando do prefeito Sandro. Esse foi o projeto escolhido pelos goianienses e o que eu quero é poder ter a oportunidade de estar ao lado dele, um grande homem, um grande político e  um grande administrador. Uma oportunidade de aprender e contribuir com a nossa cidade.