
Com a morte de Iris Rezende, Ana Paula, que trabalhou com o pai por cerca de 30 anos, decidiu tomar como missão manter viva a história do político, um dos mais importantes para a história recente de Goiás. Manteve o escritório de Iris aberto e, diariamente, recebe visitas de lideranças políticas e também de amigos do pai que só querem contar passagens vividas com ele no passado. Não surpreendeu a ninguém ela ser cotada para disputar a Prefeitura de Goiânia, último cargo que o pai exerceu. A recusa talvez sim. Quem se negaria a disputar uma eleição com o apoio do governador e do vice? Mas a decisão estava fundamentada no aprendizado que teve com o pai: é preciso aprender a fazer política. Ana Paula decidiu que, sim, vai ingressar na política partidária, que é um meio natural para ela, mas vai fazê-lo seguindo a orientação de Iris Rezende: começar aprendendo. O pai dizia que a Câmara Municipal foi sua melhor escola e Ana Paula está disposta a seguir seus passos.
TRIBUNA DO PLANALTO – A senhora chegou a conversar com seu pai, Iris Rezende, e sua mãe, Dona Iris, sobre uma eventual carreira política?
Ana Paula Rezende – Meu pai nos preparou para a falta dele, me preparou para cuidar dos negócios, das fazendas, que era o que ele fazia fora da política, e é assim até hoje, não mudou nada. Inclusive, nossa vida não mudava, com poder ou sem poder, meu pai ganhando ou perdendo, a nossa vida nunca mudou; e ele deixava isso muito claro: temos que viver de forma que a nossa vida nunca mude; temos que ter cuidado com o poder, porque o poder muda muito as pessoas. Hoje eu vejo que isso é real; e meu pai sempre foi muito forte nesse aspecto, porque participar do poder como ele participou durante tantos anos, uma vida, e ele nunca mudou o jeito de ser, aquela simplicidade, aquela humildade. Isso ele nos ensinava através das atitudes e fomos aprendendo. Meu pai não nos preparou para seguirmos para a política e hoje eu entendo. Ele falava muito, a política mudou muito, é um meio selvagem e ele não queria esse meio para nós. Meu pai sofreu muito, foi uma vida de muito sacrifício. Poder para nós nunca foi algo para aproveitar, muito pelo contrário. Meu pai era muito rígido, tinha muito medo de nos contaminarmos com o ambiente. A vida do meu pai foi difícil, apesar de ele ter se realizado na política, e acho que meu pai foi embora realizado, foi um homem feliz, mas ele teve uma vida difícil e acho que ele não queria essa vida pra nós. Por isso que eu falo que meu pai não nos preparou para seguir na carreira política.
O que pensou ao ver seu nome ser apresentado como alternativa na disputa pela Prefeitura de Goiânia?
Quando meu pai morreu, minha primeira intenção foi de nunca mais participar de nada de política, porque a política para mim era ele. Eu tinha admiração, gostava de estar perto, gostava de vê-lo fazer política, tratar as pessoas com aquela sabedoria realmente divina. Era uma vocação, uma coisa verdadeira, genuína, o amor que ele sentia. Quando ele foi embora, perdeu a graça. Nem jornal eu lia mais. Só que eu fui percebendo que o meio em que eu cresci e que nós vivemos uma vida inteira foi o político, porque a vida do meu pai era a política e ele fazia política dentro de casa, fora de casa, ele era daquele jeito. A conversa dele era essa, o pensamento dele era só isso; e fomos criados nesse meio, que era natural para nós. Eu senti que esse meio também era meu, que eu não podia sair. O lugar que eu mais sentia meu pai, comecei a perceber, era aqui, no meio político. Aí eu vi que esse meio também é meu e é onde eu quero continuar, porque me faz bem. Eu decidi que quero continuar nesse meio. No momento em que meu nome começou a ser falado, e isso foi natural, acho que por eu estar aqui, aberta para receber, conversar, isso suscitou essa possibilidade em torno do meu nome. E também porque as pessoas querem meu pai e veem em mim um pouco dele. Mas a minha responsabilidade é muito grande. Eu convivi com meu pai nos últimos quatro anos, ali na prefeitura, todos os dias, e vi as dificuldades que meu pai enfrentou, como está o meio político hoje. É realmente aquilo que ele falava, selvagem. A última coisa que as pessoas se preocupam, não digo todos, mas uma maioria, é com o bem-estar da população; está em terceiro, quarto lugar. A política que eu vivi era muito diferente, porque eu convivi com um político muito extraordinário e muito diferente, porque ninguém vive 24 horas pensando no que que pode fazer para melhorar, ajudar; isso, hoje, é muito difícil. Meu pai, com a sabedoria e a experiência que tinha, 70 anos de vida pública, passou por todos os cargos, teve dificuldades, mas se não fosse ele, do jeito que ele era, com a força que tinha, com sua sabedoria, ninguém dava conta. Teve momentos em que eu pensava que meu pai não ia dar conta. Eu sei que meu caminho não é começar com uma responsabilidade desse tamanho, de cuidar de uma cidade de um 1 milhão e meio de habitantes, porque são vidas; é uma decisão que vai mudar a vida de uma cidade. Se uma pessoa entrar ali e não der conta, isso significa um atraso para milhares de pessoas. É uma responsabilidade muito grande, até porque sei das dificuldades que Goiânia tem hoje. Duas coisas me incomodaram muito e me fizeram decidir. Primeiro, saber que o cargo é para poucos; e fiquei muito incomodada de as pessoas acharem que eu estava usando o nome do meu pai, a história do meu pai para me promover.
Como permanecer na política se não em cargos políticos?
Eu acho que o meu papel é o de manter a história do meu pai. Nós tivemos um privilégio muito grande de ter tido um político em Goiás como o meu pai, porque a política é uma atividade muito nobre. Hoje, falar que é político pega mal, mas a política verdadeira é aquela para qual a pessoa se doa, pensa em ajudar o próximo, e essa política meu pai fez. Isso eu posso dizer como testemunha viva, que viveu do lado dele e posso provar o que estou falando. Eu tenho o dever de deixar essa história eternizada para servir de referência. Eu penso nos filhos dos meus filhos e nas futuras gerações, que tenham uma referência e queiram fazer política igual o Iris fez. A vida de um político é muito importante, a escolha de um político é muito importante, porque muda o destino de um estado inteiro, de um país, de uma cidade. Ele falava muito que as pessoas precisam ter consciência da importância do voto delas. Dias desses eu vi uma entrevista dele falando isso: “hoje não é militar que põe o político lá na cadeira, que põe o governador; são as pessoas que escolhem e é papel nosso, da imprensa conscientizar as pessoas da importância desse voto, as pessoas precisam votar em pessoas do bem”. Ele ainda falou assim: “pessoas que prestam”. Porque são essas pessoas que vão definir o destino, o futuro delas. É muito sério, e acho que as pessoas ainda não têm essa consciência, de que elas precisam conhecer quem estão escolhendo, conhecer a vida, conhecer o passado, o que fez, qual é a intenção. Hoje, uma pessoa levanta uma bandeira, o eleitor não se preocupa em saber quem é e o que ele fez, vai lá e vota porque falou bonito, porque levantou bandeira tal. Por essa responsabilidade que entendi que não é esse o meu caminho.
Não é seu caminho no momento ou não é seu caminho definitivamente?
Eu não posso pegar essa responsabilidade, mas posso continuar de uma outra forma e construir o meu caminho. Eu não quero que as pessoas pensem que eu estou usando o nome do meu pai. Eu quero continuar contando a história dele e começar a construir o meu caminho.
A candidatura à vereadora está em seus planos?
Eu já cogitei, até porque meu pai falava que a Câmara foi a melhor escola política que ele teve. Um dia meu filho, ainda pequeno, falou para meu pai que ia ser político quando crescesse. Ele então perguntou o que ele ia ser e meu filho respondeu que ia ser deputado. Ele falou: não, você tem que começar igual ao vovô, começar na Câmara, como vereador. Ali você vai entender o que é a política. Meu filho virou para ele e falou assim: vô, mas o senhor não teve o avô que eu tenho. Aí ele riu e achou bom. Ele falava muito que o político tem que aprender a fazer política. Hoje, estou analisando, eu penso muito, converso muito, mas uma coisa eu decidi, eu não vou ser candidata a prefeita.
Aceitaria ser vice em uma chapa para prefeito de Goiânia com outros partidos aliados?
Não tinha pensado nessa hipótese, mas por que não? Se for um candidato que tenha os mesmos princípios. Eu estou naquela fase de analisar, conversar, ouvir, trocar ideias.
Qual o seu papel no MDB? A senhora vai trabalhar pelo partido independentemente de ser ou não candidata?
Meu pai era aquele emedebista de coração, e isso ele nos dizia: “Não existe a possibilidade de um dia eu estar em outro partido”. É como se estivesse traindo meu pai. O último ato político do meu pai foi aqui, no escritório dele, como o governador Ronaldo Caiado e com Daniel Vilela, falando para o governador: “Daniel está aqui representando o partido e nós queremos a vice”. Ele dizia que precisava fortalecer o partido. Isso três meses antes de ele morrer; ele estava pensando no partido, porque dali a quatro anos Daniel poderia vir a ser o candidato a governador. Foi o último ato político dele, fortalecer o partido. Depois, conversando com o Daniel, na primeira visita que ele me fez aqui, eu falei para ele que a partir daquele dia iríamos acabar com a disputa que existia dentro do partido entre as alas maguitista e irista. Eu falei: a gente deve aos nossos pais manter esse partido unido e para isso a gente tem que estar junto. E vamos caminhar juntos agora, em respeito à história deles e fazer esse partido ficar mais forte. E assim está sendo; Daniel tem sido muito, muito presente, muito amigo; uma coisa que foi criada depois que os nossos pais se foram. E acho isso bom, porque eu vejo o partido mais unido, agora nós somos um, só um partido. Meu papel é passar a frente as experiências que eu tive com meu pai de união, porque meu pai achava que se o partido não estiver unido ele enfraquece. Ele pensava no partido, que era o instrumento que ele tinha para ajudar as pessoas.
O MDB apoiar um nome de outro partido para prefeito de Goiânia na próxima eleição pode enfraquecê-lo, na sua opinião?
Eu não estou tão dentro do partido, Daniel é o presidente, eu estou mais de fora. Mas eu falei para o Daniel que quero ajudar, contribuir com o partido, porque eu devo isso. Mas só vou ajudar se for um candidato que eu acredite que Goiânia é prioridade para ele, que esteja pensando primeiramente na cidade.
Mesmo que ele não seja do MDB?
Mesmo que não seja do MDB, e se for do MDB e eu não acreditar, eu não vou participar, eu falei para ele. Minha preocupação é escolher um bom candidato, aquilo que meu pai falava, temos que ter consciência ao escolher. Primeiro vem do partido, escolher um bom candidato, um candidato sério, um candidato correto, que acredite, que tenha experiência.
O Jânio Darrot tem essas características?
Eu não conheço o Jânio, só de vista, não profundamente, mas ele foi prefeito duas vezes, é um homem sério, e eu sempre gostei dele, mesmo sem nos conhecermos, porque ele tinha muito respeito por meu pai todas as vezes que ia à prefeitura, como prefeito de Trindade; sempre foi oposição, mas tinha uma postura e um comportamento com meu pai que eu ficava encantada, porque muitas vezes não vemos isso nos nossos companheiros. Isso mostra um pouco o que ele é. Não tenho nada contra o nome do Jânio, mas acho que o partido tem que analisar, tem que conversar para poder dar para o eleitor a oportunidade de votar em uma pessoa que vai cuidar de Goiânia
Sua família é contra ou favor do ingresso da senhora na política partidária?
Meus irmãos me apoiam e esses dias meu irmão (Cristiano) veio aqui e disse que se eu for candidata ele vai para a rua. Na minha casa, meu marido e minha filha não concordam e eu respeito e entendo, porque a vida do meu pai, o exemplo que tivemos foi de uma vida difícil para a família, principalmente. Mas tenho certeza que, se eu decidisse entrar para a política, eles iriam junto comigo.