A deputada federal Carla Zambelli (PL-SP), condenada pela Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) a 10 anos e 8 meses de prisão e à perda do mandato por envolvimento em invasão aos sistemas do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), deixou o Brasil e afirmou que pedirá licença da Câmara dos Deputados. Fora do país, Zambelli passa a adotar uma estratégia que mescla defesa pessoal e reposicionamento político.
Saída estratégica
Segundo o cientista político Fábio Andrade, professor de Relações Internacionais da ESPM (Escola Superior de Propaganda e Marketing), a saída da parlamentar pode ter múltiplas interpretações. “Partindo do benefício da dúvida, pode ser uma viagem por razões de saúde, com intenção de retorno. Mas há hipóteses mais plausíveis”, afirma.
A mais evidente seria o reconhecimento da iminência de sua prisão. Sem apoio político suficiente para reverter a decisão do STF ou ser incluída nos projetos de anistia em curso no Congresso, Zambelli poderia estar buscando abrigo em um país sem acordo de extradição com o Brasil, como forma de evitar o cumprimento da pena.
Retorno ao radicalismo
Há, no entanto, uma segunda possibilidade que chama mais atenção de analistas: o uso político do exílio como tentativa de se reconectar com a base bolsonarista mais radical, da qual Zambelli vinha se afastando. “Com a saída de cena de Eduardo Bolsonaro e o avanço de narrativas conspiratórias nos EUA contra instituições como o STF, Zambelli pode estar tentando ocupar esse espaço simbólico no discurso bolsonarista”, avalia Andrade.
Nesse cenário, a parlamentar busca se colocar como vítima de um sistema político que, segundo ela, persegue adversários ideológicos. A estratégia mira tanto o apoio da militância bolsonarista quanto o reconhecimento internacional de setores conservadores alinhados a figuras como Donald Trump.
Implicações legais
Do ponto de vista jurídico, a fuga para o exterior não anula a responsabilização. Marcelo Crespo, coordenador dos cursos de Direito da ESPM, explica que a Justiça brasileira pode recorrer a mecanismos de cooperação internacional: “O STF pode intimá-la por meio de uma carta rogatória. É um instrumento jurídico utilizado para solicitar a colaboração de autoridades de outro país”, diz.
O processo, no entanto, pode ser lento e depende da disposição do país onde a parlamentar está. Se Zambelli estiver em uma nação da qual possua cidadania, a extradição torna-se ainda mais difícil. “Muitos países não extraditam seus próprios cidadãos. É fundamental descobrir onde foi emitido o passaporte e em que país ela se encontra”, pontua Crespo.
Narrativas em disputa
A situação de Zambelli se insere em um contexto maior de disputa narrativa no Brasil. A ala mais radical do bolsonarismo tem buscado reforçar a ideia de perseguição política, especialmente diante das decisões do STF contra aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro.
Enquanto isso, as instituições brasileiras reforçam o entendimento de que crimes contra o Estado e a democracia não podem ser relativizados sob o pretexto da liberdade de expressão ou oposição ideológica.