Em 20 de abril de 2007, o Supremo Tribunal Federal (STF) realizou a primeira audiência pública de sua história, convocada pelo ministro Carlos Ayres Britto (aposentado) para debater, de forma abrangente, aspectos da Lei de Biossegurança, como o uso científico de células-tronco embrionárias em pesquisas e tratamentos.
Desde então, 43 audiências públicas já foram promovidas para debater os mais diversos e complexos temas econômicos, políticos, sociais, religiosos e até filosóficos.
A Lei de Biossegurança (Lei 11.105/2005) envolveu grande debate no Congresso Nacional e dividiu a sociedade em relação ao uso científico de embriões humanos inviáveis. A controvérsia chegou ao STF na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 3510), proposta pela Procuradoria-Geral da República (PGR).
A audiência pública reuniu, de um lado, representantes de associações, instituições religiosas e autoridades de diversas áreas contrárias à lei. Do outro lado, participaram pesquisadores, médicos, acadêmicos e grupos que defendiam a lei e a esperança de cura e tratamento para males que até então não tinham melhores perspectivas.
Na plateia estava o músico Herbert Vianna, que, seis anos antes, havia sofrido um acidente de ultraleve que o deixou paraplégico.
Ao final dos debates, o ministro Ayres Britto afirmou que, naquele momento, o Supremo dava um passo pioneiro na democratização das discussões judiciais. “Democracia é isso. É tirar o povo da plateia e colocá-lo no palco das decisões que lhe digam respeito”, disse. Posteriormente, o STF validou a Lei de Biossegurança e assegurou o uso das células-tronco embrionárias.
O que são?
A discussão ampla com a sociedade sobre temas tão sensíveis e complexos por meio de audiências públicas no Poder Judiciário está prevista inicialmente na Lei das ADIs (Lei 9.868/1999) e na Lei das ADPFs (Lei 9.882/1999). Apesar dessa previsão legal, o STF não tinha previsão regimental sobre o rito das audiências públicas quando foram realizadas as primeiras e adotou como parâmetro o Regimento Interno da Câmara dos Deputados.
Com a Emenda Regimental 29/2009, o Tribunal normatizou o procedimento de convocação e realização das audiências públicas. Elas podem ser convocadas sempre que o relator considerar que o processo envolve tema multidisciplinar altamente complexo, com grande relevância e interesse público e que demande conhecimento técnico. Caberá ao relator coordenar a reunião, abrir prazo para inscrições, selecionar os participantes, definir datas e prazos para as manifestações e estruturar a ordem de apresentação de cada um.
Todo o material apresentado na audiência compõe um memorial juntado aos autos dos processos. Os eventos também têm de ter ampla cobertura jornalística, com transmissão ao vivo da TV Justiça, da Rádio Justiça e do canal do STF no YouTube.
Ao longo desses 18 anos, o Tribunal já discutiu os mais variados e complexos temas, como importação de pneus usados, cotas raciais nas universidades públicas, educação inclusiva, tabelamento de fretes, uso de agrotóxicos, monitoramento secreto de aparelhos de comunicação pessoal, responsabilização civil de provedores de internet e plataformas digitais, marco regulatório da TV por assinatura, biografias não autorizadas, direitos autorais, uso de amianto, financiamento de campanhas políticas, programa Mais Médicos, direito ao esquecimento e outros.