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Entre críticas e defesas: o debate sobre a reforma do Ensino Médio no Brasil

MEC suspende cronograma por 60 dias, para avaliação e reestruturação da Política Nacional de Ensino Médio. Especialistas alertam para a desigualdade educacional gerada pela reforma aprovada em 2017


Dhayane Marques Por Dhayane Marques em 12/04/2023 - 11:02

Especialistas defendem diálogo com o governo para implantar o Novo Ensino Médio. Foto: © Fernando Frazão/Agência Brasil

Após muita polêmica em volta da implantação e adaptação do Novo Ensino Médio, o Ministério da Educação (MEC) anunciou na terça-feira, 4, a suspensão do cronograma nacional de implementação do Novo Ensino Médio e que deve afetar a matriz de avaliação do Novo Enem, definido pela Portaria n.º 521, de 13 de julho de 2021. A portaria que oficializa a alteração nas datas foi assinada pelo ministro de Estado da Educação, Camilo Santana, e deve ser publicada no Diário Oficial da União nos próximos dias.  

Apesar da atual política do ensino médio estar em vigor, entidades e pesquisadores da área da educação afirmam a necessidade de revogação da lei. O prazo de suspensão do cronograma vai durar 60 dias, contados a partir do término da consulta pública promovida pelo MEC para a avaliação e a reestruturação da Política Nacional de Ensino Médio, instituída pela Portaria n.º 399, de 8 de março de 2023. 

“O que está suspenso é a portaria do cronograma de implementação do Novo Ensino Médio, especificamente, o que está relacionado ao Enem. O que estamos suspendendo é qualquer avanço na implementação, até que essa comissão defina, avalie, ouvindo a todos, quais serão as modificações, mudanças ou correções que nós faremos no ensino médio”, afirmou Camilo Santana, na sede do MEC, em Brasília, após cerimônia de assinatura de um acordo de cooperação técnica interministerial. 

Um  Ato Nacional Contra o Novo Ensino Médio, organizado pela União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (Ubes), em parceria com outras entidades estudantis e movimentos sociais, contou com mais de 50 municípios do Brasil, entre capitais e cidades do interior. Segundo a organização, mais de 150 mil estudantes de todo o  país foram às ruas pedindo a revogação da lei.

Por outro lado, defensores do Novo Ensino Médio argumentam que a reforma é necessária para modernizar a educação brasileira e preparar os jovens para os desafios do século XXI. O Todos Pela Educação chegou a lançar um documento, “Ensino Médio: contribuições para a construção de um projeto sistêmico para o Ensino Médio brasileiro”. O material aborda recomendações de ajustes na reforma em curso, além de outras medidas essenciais para viabilizar uma reforma sistêmica para a etapa.  Procurada pela redação do Tribuna do Planalto, a organização informou que “os especialistas estão entendendo ainda quais serão os impactos desta portaria, [Portaria n.º 399, de 8 de março de 2023] e quais serão as mudanças”.

No entanto, desde a sua implementação, o Novo Ensino Médio tem sido alvo de críticas e questionamentos. Alguns especialistas argumentam que a reforma foi implementada sem o devido debate com a sociedade civil e sem a participação de professores e estudantes.

Para a coordenadora do Comitê Goiás da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, Professora e coordenadora do curso de Pedagogia da FE/UFG, doutora Fabiane Lopes de Oliveira, a reforma do Ensino Médio está longe de ser igualitária e inclusiva. “Os jovens, principalmente das escolas públicas, não terão as mesmas oportunidades na sociedade, pois não estão tendo a oportunidade de ter um ensino crítico e reflexivo”, explica.

Além disso, há preocupações com relação à desigualdade educacional, já que nem todos os estudantes teriam acesso às mesmas oportunidades e às mesmas condições para escolher suas disciplinas e áreas de conhecimento. Fabiane destaca ainda, que a principal motivação para a revogação é que a educação precisa ser baseada em pensamento crítico e conhecimento científico e não com discussões que não valorizem a reflexão da realidade em que vivem.

“As críticas são muitas, começando sobre a falta de discussão com a comunidade escolar, a falta de formação continuada de professores, a implementação de uma lei que leva em consideração a questão privatista, relacionada aos institutos e fundações que têm interesse na retirada de disciplinas que tenham o foco no pensamento crítico, como filosofia e sociologia”, pontua a coordenadora.

Segundo ela, dentre as consequências de retirar essas disciplinas, reforçaria a formação de “uma massa social que não tenha senso crítico e que seja manipulável a interesses ou influenciável”.

Por meio de nota, o Consed (Conselho Nacional de Secretários de Educação), disse que “a revogação do Novo Ensino Médio não é o caminho para tornar essa etapa mais atrativa ao estudante.” O texto ressalta o papel fundamental dos técnicos de secretarias na implementação de todos os esforços técnicos e financeiros já realizados para dar início à formação de professores e reelaborar os currículos de acordo com o novo modelo. 

O manifesto da Federação Nacional das Escolas Particulares (Fenep) afirma que as escolas particulares são a favor do Novo Ensino Médio. Segundo a entidade, que congrega 40 mil estabelecimentos de ensino, “não resta dúvida de que, após tantos anos de currículo unificado, a Reforma do Ensino Médio traz a todos grandes desafios, que convocam cada estabelecimento. Há apostas a serem feitas e riscos a serem assumidos por gestores e professores. Mas de todos os públicos envolvidos, são os estudantes os que mais têm a ganhar com o Novo Ensino Médio. E, como educadores e como cidadãos, temos a serena convicção de que, são eles o foco e o propósito de nossa atuação.”

 

IMPACTOS NO ENSINO DE GOIÁS

Para a secretária de Educação do Estado de Goiás, Fátima Gavioli, a decisão do governo federal de abrir para debate a questão do Novo Ensino Médio é vista como positiva. Segundo ela, o modelo apresentado se mostrou difícil de ser aplicado. “Nós temos feito tudo que é possível, foi feito um grande investimento financeiro, hoje nós já adequamos a primeira série do ensino médio e a segunda dentro do dentro da lei que havia sido determinado no cronograma do MEC”, explicou Gavioli, ao reforçar que com a suspensão o Ministério deve ouvir unidades estudantis do ensino médio e também os professores que estão modulados hoje no ensino médio. 

Além disso, a secretária considera que em Goiás a suspensão será mais fácil do que no restante do País. “Em Goiás teremos um impacto menor, porque aqui o governador Ronaldo Caiado nunca aceitou reduzir a carga horária do ensino de Português e de Matemática”, explicou. Na ocasião, Gavioli aproveitou para tranquilizar estudantes e professores sobre o planejamento da pasta no Estado deve continuar normalmente. “Vamos aguardar os 60 dias e nos organizar para 2024 dependendo do que será definido depois da consulta”, afirmou.

O que prevê o Novo Ensino Médio

Em 2017 foi implementado no Brasil, a Lei 13.415/2017, o Novo Ensino Médio que é uma reforma educacional, com o objetivo de modernizar e atualizar o currículo da etapa final da educação básica. A reforma propõe mudanças significativas na organização do Ensino Médio, que passa a ter uma parte comum e uma parte diversificada. A implementação desse novo modelo deve ocorrer de forma escalonada até 2024.

Com o modelo, parte das aulas deverá ser comum a todos os estudantes do país, direcionada pela Base Nacional Comum Curricular (BNCC), com as disciplinas obrigatórias, como Matemática, Português, História e Geografia, e tem o objetivo de garantir uma formação básica comum a todos os estudantes. Já a parte diversificada é composta por áreas de conhecimento, como Linguagens, Ciências Humanas, Ciências da Natureza e Matemática, e permite que os estudantes escolham as disciplinas que desejam estudar, de acordo com suas preferências e interesses.

Em resumo, o Novo Ensino Médio é uma reforma que propõe mudanças significativas na educação brasileira, visando modernizar e atualizar o currículo do Ensino Médio e ampliar as oportunidades de formação para os estudantes. No entanto, a reforma ainda é objeto de debates e discussões, e é importante que a sociedade civil e os atores educacionais participem ativamente desse processo, buscando garantir uma educação de qualidade e inclusiva para todos os estudantes.

 

Dhayane Marques

Dhayane Marques é jornalista formada pela PUC-GO. Atualmente é Diretora de Programas da TV Pai Eterno e repórter no jornal Tribuna do Planalto e Tribuna de Anápolis, nas editorias de cidades, educação, economia, agro, diversão e arte.

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