A Câmara Municipal de Goiânia viveu, nesta semana, o tipo de cena que nenhum parlamento deveria protagonizar. Em vez do debate civilizado, do contraditório democrático e da defesa de ideias, o que se viu foi um episódio que remete ao Velho Oeste: gestos bruscos, dedo em riste, tensão generalizada e a suspeita — gravíssima — de que um servidor público de alta patente circulava armado dentro da sede do Poder Legislativo.
O agora ex-procurador-geral da Câmara, Kowalsky Ribeiro, tornou-se o personagem central desse enredo. Imagens de videomonitoramento mostram que ele deixou seu veículo com uma arma em punho, que logo foi colocada na cintura, antes de se envolver numa discussão ríspida com o chefe de gabinete do vereador Sargento Novandir (MDB). O gesto não deixa dúvidas: o procurador estava armado dentro do prédio da Câmara, o que por si só representa uma violação das normas da Casa e um agravante no exercício de suas funções. Para a Justiça, ele reconheceu que circulava armado justamente por viver em clima de pé-de-guerra com o militar e seus servidores.
Não bastasse a cena, vieram as consequências. Uma guerra de versões, acusações públicas, dossiês com ocorrências policiais e um plenário que, em vez de discutir os rumos da cidade, passou a deliberar sobre o comportamento de seus próprios quadros. Novandir, com colete à prova de balas, e Kowalsky, em silêncio, trocaram farpas por vias formais e informais. O episódio ganhou contornos de crise institucional, e não sem razão.
O recado que se passa à sociedade é alarmante: seria impensável um cidadão comum entrar armado na Câmara, mas há quem acredite estar acima das normas que a própria Casa aprovou. A Resolução nº 03/2022, que proíbe o porte de armas por parlamentares e servidores nas dependências do Legislativo, não é um enfeite. É uma regra. E foi ignorada.
A decisão de Kowalsky em pedir exoneração foi um passo necessário. Mas não resolve o problema maior: o ambiente de intimidação que se instalou nos bastidores do Legislativo goianiense. É preciso responsabilidade. É preciso que a Câmara volte a ser uma Casa de Leis, e não uma arena de confrontos pessoais. O Parlamento é, por excelência, o espaço do argumento. O único “disparo” admissível ali é o da palavra bem usada. Que este episódio sirva como ponto de inflexão: não como rotina.