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Empregado CLT Premium: Modernização ou Precarização de direitos do trabalhador?


Tyago Cruz Por Tyago Cruz em 30/10/2024 - 06:00

Uma nova proposta visa flexibilizar a CLT para atender às demandas do mercado moderno, mas gera debate sobre possíveis precarizações.
Uma nova proposta visa flexibilizar a CLT para atender às demandas do mercado moderno, mas gera debate sobre possíveis precarizações. Foto: Freepik

A proposta da “CLT Premium” vem chamando atenção no Brasil como uma tentativa de modernizar e flexibilizar a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) – um marco regulatório de 1943, concebido para um mundo que era, em muitos aspectos, completamente diferente do atual. O termo “CLT Premium” não surgiu oficialmente no vocabulário jurídico, mas foi cunhado por especialistas e políticos como um termo que resume a busca por uma alternativa ao regime tradicional da CLT, especialmente para os profissionais mais qualificados. Em vez de extinguir direitos, a ideia seria criar uma “versão premium” das relações trabalhistas, com flexibilidade e adaptação para atender às novas exigências do mercado de trabalho. Segundo o advogado e professor de direito trabalhista Ricardo Calcini, “a CLT Premium tenta responder a uma mudança global nas relações de trabalho, que pedem maior autonomia e mobilidade para os profissionais” (Revista Consultor Jurídico, 2023).

Com a CLT Premium, surge a possibilidade de contratos mais flexíveis e personalizados, onde o trabalhador, especialmente aquele com alta qualificação, negocia diretamente suas condições de trabalho, incluindo jornada, remuneração e benefícios específicos, como participação em lucros, bônus e até seguros diferenciados. Esse modelo busca atender à necessidade de flexibilidade que muitos trabalhadores já experimentam na prática, especialmente em setores como tecnologia e consultoria. Em empresas como a XP Inc., um exemplo frequentemente citado, profissionais da área de tecnologia têm a possibilidade de negociar suas jornadas de trabalho e definir metas específicas. Além disso, a XP utiliza um sistema de bônus por produtividade, vinculado diretamente ao desempenho dos funcionários, o que representa uma abordagem inspirada nos princípios que fundamentam a CLT Premium.

Porém, a CLT Premium não é uma ideia unânime e levanta discussões profundas, especialmente entre sindicatos e setores mais conservadores. Muitos temem que essa flexibilização seja uma porta de entrada para a perda de direitos conquistados a duras penas. No Brasil, a proteção ao trabalhador é quase cultural, uma resposta às frequentes precarizações e aos desequilíbrios de poder entre empregadores e empregados. O presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Sérgio Nobre, alerta: “Não podemos permitir que a flexibilização se transforme em exploração. A CLT Premium precisa de uma regulamentação robusta que evite abusos e mantenha a proteção mínima dos trabalhadores” (CUT, 2024). Críticos da CLT Premium apontam que, ao dar ao trabalhador o poder de negociar diretamente com a empresa, aqueles em situação mais vulnerável poderão se sentir pressionados a aceitar condições abaixo do padrão para se manterem competitivos.

Para empresas, a CLT Premium pode ser um verdadeiro trunfo competitivo, especialmente em setores que enfrentam dificuldades para reter talentos e inovar constantemente. A fintech Nubank, por exemplo, tem aplicado práticas semelhantes às da CLT Premium ao oferecer horários flexíveis e trabalhar com uma estrutura baseada em resultados em vez de horas trabalhadas. Esse modelo, amplamente utilizado na área de tecnologia, permite que os trabalhadores ajustem seus horários conforme suas necessidades, sem perder o foco nas metas de desempenho. Porém, essa flexibilidade coloca uma responsabilidade extra para as empresas, que precisam manter um ambiente de trabalho seguro e ético. A advogada trabalhista Fabiana Oliveira ressalta que “a liberdade contratual precisa ser acompanhada de salvaguardas para evitar que a flexibilidade se transforme em precariedade” (Folha de S.Paulo, 2024).

Para evitar distorções, a regulamentação da CLT Premium precisaria ser clara e cautelosa. Definir limites de flexibilidade e criar instrumentos de fiscalização seriam passos essenciais para impedir que o modelo vire uma ferramenta de precarização. Em países como o Reino Unido, um modelo similar à CLT Premium existe com o *”self-employed status”*, onde trabalhadores autônomos podem negociar diretamente com as empresas. No entanto, há diretrizes específicas que asseguram direitos como licença-maternidade e segurança ocupacional, garantindo que a flexibilidade contratual não comprometa a proteção mínima. Assim, no Brasil, órgãos reguladores como o Ministério do Trabalho teriam que desenvolver uma estrutura que acompanhe de perto o modelo CLT Premium, criando um sistema que balanceie a autonomia contratual e a proteção dos direitos trabalhistas.

A CLT Premium representa, portanto, uma promessa de modernização e adaptação das leis às novas realidades do trabalho. O sucesso desse modelo depende diretamente de como será implementado: se com equilíbrio e responsabilidade, pode ser uma alternativa valiosa para trabalhadores que buscam flexibilidade sem abrir mão de proteção. Mas, se usada para reduzir custos e comprometer direitos, a iniciativa corre o risco de aprofundar a precarização e as desigualdades no mercado de trabalho. Como destaca o economista Eduardo Giannetti, “a grande questão é como equilibrar competitividade com equidade nas relações de trabalho, sem sacrificar direitos adquiridos” (Estadão, 2023). Em última análise, o impacto da CLT Premium nas relações trabalhistas dependerá da capacidade do Brasil de dialogar, adaptar-se e encontrar um caminho que privilegie tanto a proteção do trabalhador quanto a inovação e competitividade das empresas.

Tyago Cruz

Advogado, Especialista Direito Empresarial, Professor e Empresário.

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