Ao assumir a pasta, o secretário Pedro Leonardo afirmou que a área cultivada por grãos em Goiás, de aproximadamente 7 milhões de hectares, pode dobrar sem que haja a necessidade de abertura de novas áreas, apenas nas pastagens degradadas. E é nas regiões Norte e Nordeste que tem sido observado o avanço da produção de grãos sobre as passagens degradadas. É também nessa região que o governo está investindo na fruticultura, projeto que inicialmente vai ajudar 150 pequenos proprietários rurais a produzir maracujá e manga.
TRIBUNA DO PLANALTO – Qual o modelo de produção agrícola adotado pelo estado de Goiás, considerando os desafios, as prioridades e os objetivos?
PEDRO LEONARDO DE PAULA REZENDE – Goiás tem como característica principal justamente essa heterogeneidade, é um estado muito heterogêneo, tem regiões com vocação produtiva mais direcionada a commodities e outras têm outros potenciais e o que temos buscado é desenvolver de maneira regionalizada, considerando as vocações produtivas de cada região. Nesse sentido, nas regiões Norte e Nordeste, que são consideradas prioritárias, nós identificamos um potencial muito importante para o desenvolvimento da cadeia da fruticultura, considerando inclusive que a região é privilegiada do ponto de vista logístico. A região Nordeste tem proximidade com grandes centros consumidores, principalmente o mercado de Brasília, além das características produtivas que são extremamente adequadas para o desenvolvimento da cadeia produtiva das frutas, características de solo, chuvas, altitude e temperatura favorecem muito a implantação de projetos na área de fruticultura. Além disso, uma característica importante do Nordeste é que ela é constituída predominantemente por propriedades rurais da agricultura familiar, pequenas propriedades rurais. Isso também é um fator importante para o desenvolvimento da cadeia produtiva de frutas, porque as frutas constituem uma cadeia produtiva que o produtor não requer grandes extensões de área para ter um retorno adequado. Diante desse diagnóstico, identificados com essa potencialidade, estamos levando esse grande projeto estruturante de desenvolvimento da fruticultura para o Norte do Goiás, em princípio na região do Vão do Paranã. Vamos lançar no mês de junho o projeto piloto com mais de 150 produtores, que vão receber kits de irrigação que foram adquiridos pela Secretaria da Agricultura em parceria com a Codevasf (Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba), além de assistência técnica e assessoramento para acessar os canais de comercialização.
Quais frutas vão ser produzidas na região?
Em princípio, nesse projeto piloto, vamos implantar sistemas de produção de manga e maracujá. O maracujá porque tem um retorno financeiro a partir de seis meses de implantação e é importante que o produtor já tenha receita para conseguir honrar com os compromissos financeiros. Em segundo momento, a manga, que vai iniciar o processo produtivo em três anos. Mas, até que a manga inicie o processo produtivo, ele vai ter como fonte de receita principal o maracujá, que começa a produzir com seis meses. A intenção é agregar outras frutas, porque identificamos potencial produtivo para vários tipos de frutas, inclusive uva. A região tem condições e características climáticas extremamente favoráveis. Mas o nosso objetivo é iniciar o projeto com essas frutas que são menos laboriosas para depois, a partir do momento em que o produtor for adquirindo esse nível de maturidade, ele possa implantar outras frutas.
Quais seriam os mercados para essa produção?
Goiás importa a maioria das frutas para atender a demanda interna, e muitas vezes essas frutas vêm de outros estados e até de outros países. Nosso intuito inicial é atender primeiro as oportunidades de mercado interno, aproveitando essa proximidade com esse grande mercado consumidor de frutas, que é o mercado de Brasília, mas em segunda perspectiva o objetivo é exportar para os países que são parceiros comerciais do estado de Goiás e que têm constantemente nos solicitado essa demanda por frutas. Pretendemos trabalhar com esses mercados prioritários: Brasília, Goiânia e, em segundo momento, até operações de exportação.
Quais os projetos para as outras regiões do estado?
Nós temos como diretriz governamental o desenvolvimento regionalizado do estado de Goiás e, nesse propósito de desenvolvimento regionalizado, as regiões Norte e Nordeste são prioritárias, até em função dessa característica heterogênea de desenvolvimento. O estado de Goiás tem uma região agrícola muito desenvolvida nas regiões Sul e Sudeste e muitas vezes os indicadores de desenvolvimento das regiões Norte e Nordeste estão muito aquém desses indicadores que são observados na região Sul e Sudeste. Nesse primeiro momento, temos como diretriz priorizar as regiões Norte e Nordeste até para alcançar esse objetivo principal, que é de desenvolvimento regionalizado, fazendo um estado mais igualitário do ponto de vista do desenvolvimento. Mas existem outras iniciativas também direcionadas para as regiões Sul e Sudeste. No Sudoeste estamos implantando um APL (Arranjo Produtivo Local) de abacate também em sinergia com esse propósito de desenvolver a cadeia produtiva da fruticultura. Esse APL é mais direcionado ao atendimento das demandas do setor industrial, inclusive para a fabricação de cosméticos a partir desse ecossistema produtivo. Nesse primeiro momento vão para produção de abacates, mas a nossa intenção é cada vez mais pulverizar essa iniciativa, implantando projetos de desenvolvimento da cadeia de fruticultura em todas as regiões.
Qual a importância da agricultura familiar para a economia de Goiás, um estado reconhecidamente produtor de commodities?
Uma informação é que o estado de Goiás é constituído predominantemente por propriedades rurais da agricultura familiar. Segundo o último censo do IBGE, o estado de Goiás tem aproximadamente 150 mil propriedades rurais, dentre as quais, cerca de 90 mil, ou seja, 60%, são propriedades rurais caracterizadas como da agricultura familiar. Isso demonstra a importância e a relevância desse segmento para o agronegócio de Goiás, mas também para a segurança alimentar. É importante que tenhamos a compreensão da importância do segmento para o abastecimento, principalmente de produtos de origem hortifrutigranjeira. Esses produtos, principalmente o hortifrúti, são 90% provenientes da agricultura familiar. Ao promovermos o crescimento da agricultura familiar, o resultado é o aumento desses produtos no mercado, e aumentando a oferta o primeiro impacto é sobre os preços desses produtos. A tendência é que haja uma redução dos preços desses produtos para o produtor final na medida em que se aumenta a oferta. E a oferta só será aumentada promovendo o fortalecimento da agricultura familiar, que é a grande responsável pela produção dos principais produtos que compõem a cesta básica. Além disso, o leite é uma cadeia tipicamente da agricultura familiar, até porque 52% de todo leite que é produzido em Goiás provém de propriedades rurais da agricultura familiar. Nosso esforço tem sido no sentido de elaborar e executar as políticas públicas que possam auxiliar os produtores rurais da agricultura familiar a serem incluídos nesse processo de desenvolvimento que é proporcionado pelo agronegócio.
Sobre o agronegócio o senhor afirmou, ao assumir a pasta, que a produção agrícola de Goiás pode crescer. Qual a base para esse crescimento?
O estado de Goiás figura entre os três maiores produtores de grãos do país e tem um potencial de expansão dessa produção de grãos que poucos estados têm. Goiás tem aproximadamente 7 milhões de hectares cultivados com grãos e tem o potencial de dobrar essa área plantada, considerando apenas as áreas de pastagens degradadas sem que haja a necessidade de abertura de novas áreas de preservação. Poucos estados que estão entre os maiores produtores têm esse potencial de elevação da produção e, principalmente, elevação da produtividade. O que esperamos é poder levar as políticas públicas necessárias ao desenvolvimento, a parte de regulamentação, a parte de incentivo é fundamental para que se consigam esses indicadores e esses resultados de aumento de produção e de produtividade, considerando o potencial que o estado tem de até dobrar essa área plantada utilizando apenas as áreas de pastagens degradadas. E outra outra informação importante dentro dessa perspectiva é que talvez a última fronteira agrícola do estado de Goiás com potencial para contribuir com esse aumento de produtividade são as regiões Norte e Nordeste, onde temos observado o avanço da produção de grãos sobre as áreas e passagens degradadas. Outra informação importante é que, apesar de haver esse aumento da área cultivada com grãos em detrimento das passagens, temos observado o aumento do rebanho. O estado de Goiás já tem o segundo maior rebanho do país, com aproximadamente 24 milhões de cabeças. Enquanto há uma redução da área de pastagem, ocorre um aumento do rebanho e isso demonstra uma eficiência, um aumento em produtividade, que diz respeito à produção por unidade diária. Isso se deve muito aos investimentos em tecnologias, que têm permitido que o estado de Goiás alcance os resultados que tem alcançado.
A secretária do Meio Ambiente, Andrea Vulcanis, declarou recentemente que o desmatamento é o mais grave problema ambiental de Goiás. É possível dobrar a área cultivada sem aumentar o desmatamento, que, segundo a secretária, foi em média de 30 mil hectares nos últimos quatro anos?
Exatamente. O estado de Goiás tem um potencial de expansão de área cultivada considerando apenas os locais com pastagens degradadas, sem que haja necessidade de abertura de nenhuma nova área de preservação permanente. Além disso, o produtor rural está cada vez mais consciente da necessidade de implantação de práticas sustentáveis dentro do sistema produtivo. As fontes naturais, principalmente as fontes hídricas dentro da propriedade rural, são o principal ativo que o produtor rural tem. A água dentro da propriedade é um requisito fundamental para que o produtor tenha produtividade e a preservação dessa utilização dessa água, a preservação das nascentes, das matas ciliares é fundamental para que o produtor mantenha seu principal ativo, que é a água.O produtor rural goiano está cada vez mais consciente dessa importância e o que esperamos é que possamos propor políticas públicas que possam resultar em melhoria dos aspectos de sustentabilidade ambiental.
Em relação à falta de água, o Sudoeste goiano já tem registrado falta de água até mesmo para o consumo humano. Essa situação pode vir a impactar esse projeto de dobrar a área cultivada?
Não há nenhum risco com relação a isso porque o estado de Goiás tem uma legislação ambiental muito bem consolidada e muito bem fiscalizada pela Secretaria do Meio Ambiente, que tem total controle e políticas eficazes de utilização das fontes hídricas. O serviço implementado pela Secretaria do Meio Ambiente é o que tem garantido que não haja um uso inadequado das fontes hídricas de maneira a causar prejuízo ou falta de água. Todos os projetos de expansão, principalmente das cadeias prioritárias, como as da fruticultura, já consideram a disponibilidade hídrica de que o estado de Goiás dispõe, considerando os aspectos legais e os aspectos técnicos que demonstram a permissibilidade da utilização dessas fontes hídricas. Não há nenhum risco com relação à disponibilidade de água porque o estado de Goiás tem uma fundamentação legal bem consolidada quanto a essas fontes hídricas.
O Brasil é considerado o celeiro do mundo porque abastece muitos países. É importante ter esse título em um mundo cada vez mais tecnológico? É importante continuar investindo em produção primária na contramão do mundo, que investe em tecnologia?
Só é possível ter aumento do setor primário mediante investimentos em tecnologia. Os indicadores de produtividade que o setor primário tem alcançado dão exemplo a outros países. Temos recebido frequentemente comitivas de embaixadas de outros países que nos visitam para entender como que o estado de Goiás saiu, no passado recente, de uma posição de importador de alimentos para o que é hoje, um expoente mundial da produção de alimentos. O desafio nosso é cada vez mais agregar valor a tudo aquilo que é produzido. Precisamos fortalecer os processos agroindustriais de forma a agregar valor aos produtos primários Esse é o desafio e o que temos buscados são alternativas para promover essa agregação de valor mediante processos industriais.
Já há iniciativas que conciliam o agronegócio com a indústria no governo de Goiás? Desde o ano 2000 a indústria vem só recuando no Brasil, o que é considerado um retrocesso, além de nos levar a importar tecnologia. Na agricultura, por exemplo, usamos fertilizantes importados. Exportamos produtos primários e importamos tecnologia. É um modelo interessante para Goiás e para o país?
O que precisa se entender é que em um passado não muito distante o Brasil era importador de alimentos, era incapaz de produzir alimentos para atender a própria demanda interna de alimentos. E hoje somos o principal expoente mundial na produção de alimentos e isso graças a tecnologias como a do plantio direto, o uso rotativo de culturas, a prática de uso alternativo de bioinsumos.O governo de Goiás editou um decreto de lei que regulamenta a utiliza de bioinsumos justamente como alternativa para diminuir a dependência do país de maneira geral tem com relação principalmente aos fertilizantes. No passado, o Brasil ia aos outros países para buscar tecnologia e hoje o que vemos é uma realidade totalmente diferente, países vêm a Goiás para buscar tecnologias desenvolvidas aqui.
Em relação à geração de emprego, o agronegócio emprega menos que os demais setores. Nos Estados Unidos, maior exportador de produtos agrícolas do mundo, o agro é responsável por 1% das vagas de emprego. Por que seria interessante para o poder público investir em um setor com baixo nível de empregabilidade?
Se pegarmos os últimos resultados do Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados), o estado de Goiás foi o segundo estado que criou mais novas vagas de emprego e é importante ressaltar que a principal atividade econômica do estado de Goiás é o agronegócio. Essa realidade que se aplica nos Estados Unidos não é uma verdade absoluta para a realidade do estado de Goiás e não é essa a informação que os relatórios oficiais do Caged demonstram. Mesmo no período de pandemia, em que todas as atividades econômicas demitiram mais do que contrataram, o agronegócio foi a única atividade produtiva que contratou mais do que demitiu. O agronegócio foi a única atividade econômica que apresentou saldo positivo com relação a novas vagas de emprego. Isso demonstra a relevância do setor para o estado ter a sua base econômica fundamentada no agronegócio.
A chamada Taxa do Agro acabou criando um atrito com o setor do agronegócio goiano. Essa crise foi pacificada?
Com certeza. O Fundeinfra (Fundo Estadual de Infraestrutura) é um fundo que, primeiro, é administrado por entidades que compõem o Conselho Administrativo e esse conselho é constituído por entidades representativas no setor produtivo, que representam os produtores rurais. O conselho é que determina quais as diretrizes e onde esses recursos serão implementados. Outra informação importante é que existe uma série de cadeias produtivas que são isentas do recolhimento da taxa, principalmente as propriedades da agricultura familiar, e em Goiás são aproximadamente 63% das propriedades rurais são da agricultura familiar. Essas propriedades são isentas do Fundeinfra, além disso a cadeia produtiva do leite não recolhe, itens da cesta básica não recolhem, itens que constituem a cadeia produtiva do setor de bovinos só recolhe gado em determinação, pecuária de cria não recolhe. A esmagadora maioria das propriedades rurais do estado de Goiás não recolhe Fundeinfra. Outro critério extremamente importante e que foi importante também nesse processo de pacificação é a importância do fundo para a inclusão produtiva. Muitos produtores dessas 152 mil propriedades rurais de Goiás não produzem porque não têm garantia de que vão conseguir escoar essa produção porque não tem condições necessárias de infraestrutura. Às vezes o produtor rural desiste de produzir porque não tem a garantia que vai conseguir escoar a sua produção. Ao realizar os investimentos em infraestrutura a partir do fundo que esperamos é inclusão produtiva. Quantos produtores que até então não produziam, não participavam desse processo produtivo porque não tinham como, não só escoar a produção, mas também trazer os insumos necessários para dentro dessa propriedade. Além disso, é muito mais oneroso para o produtor rural transportar os seus insumos ou transportar sua produção em estradas que não tenham condição adequada de trafegabilidade.