Por unanimidade, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) confirmou a condenação de um laboratório a pagar R$ 300 mil de indenização para a participante de uma pesquisa clínica que desenvolveu doença dermatológica rara e incapacitante. O estudo visava avaliar a biodisponibilidade e a eficácia de um medicamento similar, que seria lançado pelo Ache Laboratórios Farmacêuticos S/A.
A mulher relatou os primeiros sinais da doença dez dias após a segunda rodada de aplicação do medicamento drospirenona + etinilestradiol, uma formulação amplamente utilizada em anticoncepcionais orais. Ela acionou a Justiça para ter o custeio integral dos tratamentos dermatológico, psicológico e psiquiátrico, além de indenizações por danos morais, estéticos e psicológicos.
O TJ-GO reconheceu o nexo causal entre o uso do medicamento e o surgimento da doença e condenou o laboratório a indenizar a vítima em R$ 300 mil, além de pagar pensão vitalícia de cinco salários mínimos devido à redução da capacidade de trabalho causada pelas sequelas irreversíveis.
Em recurso ao STJ, o laboratório alegou que o TJ goiano inverteu indevidamente o ônus da prova, exigindo a produção de uma prova negativa. Além disso, argumentou que os valores da condenação deveriam ser reduzidos, pois a renda da vítima era inferior a um salário mínimo antes da pesquisa, e a manutenção integral da decisão do TJ-GO representaria enriquecimento ilícito.
Pesquisas com seres humanos
A relatora do recurso, ministra Nancy Andrighi, afirmou que a fragilidade da perícia realizada impediu a confirmação, com grau de certeza, do nexo causal entre a administração do medicamento e o desenvolvimento da doença. No entanto, a ministra enfatizou que o TJ-GO, ao considerar outros elementos que endossavam as alegações da vítima, atribuiu ao laboratório o risco pelo insucesso da perícia.
Além disso, a ministra destacou que a RDC 9/2015 da Anvisa estabelece que o patrocinador é responsável por todas as despesas necessárias para a resolução de eventos adversos decorrentes do estudo clínico, como exames, tratamentos e internação.
Nancy Andrighi também apontou que a Resolução 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde disciplina pesquisas com seres humanos. “A resolução responsabiliza o pesquisador, o patrocinador e as instituições e/ou organizações envolvidas nas diferentes fases da pesquisa pela assistência integral aos participantes, no que se refere às complicações e aos danos decorrentes, prevendo, inclusive, o direito à indenização”, observou.
Por fim, a relatora destacou que o pensionamento mensal de cinco salários mínimos não configura enriquecimento sem causa, uma vez que se considerou não apenas a subsistência, mas também o valor necessário para cobrir os tratamentos médicos exigidos pelo seu quadro. “Reconhecida a incapacidade permanente da autora, é devido o arbitramento de pensão vitalícia em seu favor”, concluiu.