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Paço reclassifica despesas em investimentos para melhorar situação fiscal

Estratégia contábil ajuda a inflar percentual de investimentos e pode melhorar a nota da Capag


Lucas de Godoi Por Lucas de Godoi em 19/05/2025 - 07:50

Paço Municipal de Goiânia. Foto: Secom
Nova estratégia fiscal do Paço inclui transferências de fontes e mudança na natureza de gastos para melhorar imagem da Prefeitura junto à STN (Foto: Divulgação)

A Prefeitura de Goiânia tem adotado medidas contábeis, como a reclassificação de despesas correntes para a rubrica de investimentos, com o objetivo de recuperar a saúde financeira da capital e melhorar os indicadores fiscais. A medida busca elevar a nota da Capacidade de Pagamento (Capag), avaliação da Secretaria do Tesouro Nacional que influencia o acesso a crédito. Também estão em curso ações de controle de gastos com pessoal e cerco à sonegação para aumentar a arrecadação.

Por meio de decretos, a Secretaria da Fazenda tem realizado a redistribuição orçamentária entre fontes, o que implica transferir despesas de custeio originalmente previstas com recursos próprios do Tesouro Municipal para fontes vinculadas, como fundos ou convênios.

Nos primeiros meses de 2025, a Prefeitura de Goiânia publicou ao menos quatro decretos orçamentários que redistribuem recursos entre diferentes fontes de verba, com o objetivo de ajustar as rubricas de despesas e melhorar o equilíbrio fiscal.

Os decretos já publicados transferem recursos dentro da Secretaria Municipal de Infraestrutura Urbana, e entre o Fundo Municipal de Saúde e o Fundo Municipal de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino. 

Sem aumento

Essa reclassificação técnica, sem alterar o valor total da despesa, permite aliviar a pressão sobre o caixa livre, elevar o percentual de investimentos no orçamento e apresentar um retrato fiscal mais robusto no fechamento do exercício, com possível impacto positivo junto aos órgãos de controle e à opinião pública.

 Uma fonte da Sefaz, ouvida sob reserva pela reportagem, explica que alguns tipos de despesa mista, que era registrada como corrente, agora serão computados como investimento. “Um computador novo, por exemplo, pode ser tratado como investimento porque será incorporado ao patrimônio”, exemplifica.

Outro caso mencionado é sobre pagamentos para o desenvolvimento de softwares, que se registrava como serviço de tecnologia, classificação de despesa corrente, e não investimento. Agora, registrado na rubrica adequada, vai ajudar a melhorar os resultados deste indicador.

Aval da Câmara

Quando não é possível apenas redistribuir saldos, a Prefeitura recorre ao Legislativo para autorizar novas fontes de investimento, como ocorreu diante de um remanejamento de R$ 10 milhões solicitado pelo prefeito Sandro Mabel (UB) para fonte de investimentos da Secretaria de Infraestrutura Urbana (Seinfra). O projeto de lei foi aprovado na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara Municipal na última quarta-feira (14) e ainda vai passar pelo Plenário.

Durante a tramitação desta matéria, o vereador Lucas Kitão (UB), um dos defensores da medida, esclareceu aos colegas mais reticentes que a estratégia do Paço é justamente mudar a característica dos recursos para inflar o porcentual de investimento e melhorar a classificação Capag. Segundo o vereador, “o governo irresponsável que teve aí (Rogério Cruz) deixou nossa cidade com nota C.”, disse. “Então, nós não temos acesso a crédito e o prefeito está fazendo essas organizações”, explicou.

Para exemplificar, Kitão fez um comparativo didático: “Esses R$ 100 mil, vereadora Kátia, lá na Semad, ele tem característica de despesa. Os mesmos R$ 100 mil, na Seinfra, ele tem característica de investimento. Quem analisa, a Secretaria do Tesouro Nacional que vai tirar a nota da nossa Prefeitura, vai medir isso: quanto mais percentual de investimentos nós tivermos em Goiânia, maior a nossa nota”, esmiuçou o vereador.

Segundo Lucas Kitão, esse tipo de operação vai passar a acontecer com frequência na administração do Município, tendo em vista a “missão de subir a nossa nota” de classificação fiscal. “Então, por que não fazer arranjos puramente administrativos para mostrar para a Secretaria do Tesouro Nacional que Goiânia tem mais valor de investimentos do que de despesa?”, indagou.

Na Câmara, vereadores de oposição criticaram a falta de transparência do Executivo com a matéria que, mesmo com pedido de vista, não enviou informações oficiais para justificar a operação de crédito.

Desafio da Prefeitura é encontrar espaço para reduzir despesa

O principal desafio da administração municipal é respeitar o limite legal de gastos com custeio, conforme os critérios de liquidez observados pela STN para estipular a classificação da CAPAG. Um especialista explicou à reportagem que a prefeitura só pode aplicar até 85% da sua receita corrente em despesas correntes, como folha de pagamento, manutenção e serviços. O restante deve ser reservado para investimentos.

Para o economista Luiz Carlos Ongaratto, a Capag funciona como um termômetro da saúde financeira da prefeitura. Ele considera três pontos principais: o tamanho da dívida em relação ao que a cidade arrecada; o quanto sobra para investir depois que as despesas são pagas; e o dinheiro disponível para honrar as contas do dia a dia. Esses fatores juntos mostram se as contas municipais estão equilibradas ou se há risco de desequilíbrio.

Na visão dele, o resultado atual reflete decisões da última administração e que exigem que o município encontre brechas para enxugar custos de despesas correntes e abrir margem para o investimento. “É preciso saber onde estão os maiores gastos da prefeitura, fora a folha, para tentar renegociar esses contratos e a dívida, buscando alongar os prazos para aumentar a disponibilidade de caixa.”, explica Ongaratto.

A Tribuna do Planalto mostrou, em reportagem de abril, que a administração havia fixado um teto de 85% do orçamento para as despesas correntes líquidas e outros 15% são reservados para amortização de dívidas e realização de obras, estratégia que busca, justamente, restabelecer a saúde fiscal e atrair novos financiamentos internos e externos.

Entre os pontos mencionados por especialistas, também estão a observância dos índices de liquidez e pagamento regulares de precatórios, além de controle dos gastos com pessoal, com medidas como corte de gratificações e restrição a nomeações já implementadas pela atual gestão. Em outra frente, o aumento de arrecadação passa por reforço de fiscalização, com ações conjuntas com Governo de Goiás para combate à sonegação fiscal.

Resposta

A Prefeitura de Goiânia foi procurada pela reportagem para comentar a respeito dos recentes decretos de redistribuição orçamentária entre fontes e do projeto de lei aprovado na CCJ da Câmara Municipal que autoriza remanejamento de recursos para a rubrica de investimentos da Seinfra. No entanto, a administração não enviou posicionamento até o fechamento desta edição.

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