Um dos líderes evangélicos mais influentes de Goiás, bispo Oídes do Carmo é um religioso que defende a participação da igreja e dos fiéis na política como uma extensão da própria cidadania. Essa participação se dá no campo conservador-liberal, pois esses são os princípios dos evangélicos, afirma o bispo, que admite ter ficado frustrado com a troca da candidatura de Márcio Cândido por Eerizânia Freitas, em Anápolis, e que a substituição de Vilmar Mariano por Leandro Vilela não seria necessária se o prefeito de Aparecida de Goiânia contasse com o apoio do governador Ronaldo Caiado e de Gustavo Mendanha.
TRIBUNA DO PLANALTO – Como a religião se tornou uma variável importante na política e nas eleições?
OÍDES JOSÉ DO CARMO – Eu acho que foi pelo natural crescimento numérico dos evangélicos, que hoje, seguramente, quase 30%, ou um pouco mais, da população brasileira figura como evangélica. Esse número expressivo naturalmente é enxergado, tem quadros, tem pessoas que militam na política e tem interesse no país, no estado e no município, porque o papel da religião tem que ser compreendido não só no campo espiritual. Por muitas décadas, quiseram reduzir a ação dos religiosos à ação espiritual, mas a igreja é composta de homens e mulheres, moças e rapazes, crianças e adolescentes e esse povo tem uma militância normal no dia a dia da vida, tem demandas como qualquer segmento da sociedade, e acaba que tendo que tomar uma posição. Isso foi crescendo, foi se agigantando e, graças a Deus, hoje a sociedade e o mundo político olham com outros olhos, respeitando a força do segmento e, às vezes, convidando o próprio segmento para participar da atividade política pública.
Como o fiel evangélico compreende essa participação dele na política? Seria uma obrigação?
A igreja procura formar o cidadão pleno, uma pessoa que que exerça plenamente sua cidadania. Ele é incentivado a isso nas igrejas; é cobrado por todos nós a pagar os seus impostos, a ser honesto no dia a dia, a não praticar crimes e delitos, ser uma pessoa correta; ele também é cobrado a ter uma vida ativa como cidadão, porque não é pelo fato de ser religioso que deixou de ser um cidadão. Eu vejo que ele enxerga a sua participação como uma coisa natural como qualquer outro segmento da sociedade também enxerga.
O voto evangélico é homogêneo?
Quase que posso dizer que não é, mas temos, por exemplo, a mesma formação, os valores são os mesmos, defendemos os princípios, especialmente os valores cristãos de família; e esse conjunto de evangélicos acaba caminhando numa direção só pela sua filosofia de vida, porque se identificam uns com os outros no pensamento, na ideologia, na vida. Mas não são homogêneos, porque não tem essa questão de unanimidade em lugar nenhum. Tem também pessoas que pensam diferente no seio da igreja, é claro que temos. Mas não temos essa guerra interna em razão disso, porque quando se ensina valores, ensina respeito ao próximo, à opinião, o direito à opinião, o direito à palavra.
Então há divergências entre as denominações evangélicas em relação à atividade política?
Existem certas condutas que estão diferenciadas. Por exemplo, as igrejas consideradas mais tradicionais pouco se envolvem com a política. São cidadãos, participam, mas não têm essa vida muito ativa que os pentecostais e neopentecostais têm dentro dessas igrejas. Não há nenhuma divergência entre nós em relação a isso, nós respeitamos as igrejas tradicionais e eles têm que respeitar também o direito que as igrejas têm de participar do processo político.
Quais são os principais anseios do eleitor evangélico na política?
Primeiro o que eles querem é o seguinte: que a fé seja respeitada, que eu tenha liberdade de me expressar, de viver a minha vida e, graças a Deus, no Brasil, nós temos essa liberdade. É certo que a nossa luta é para manter o direito que eu tenho de exercer a minha religião, a minha prática não só enclausurado numa igreja, como alguns parlamentares no passado quiseram, mas também viver o cristianismo, porque o cristianismo não é uma religião, é um estilo de vida. Queremos ter essa liberdade, mas é claro que temos valores que defendemos. Por exemplo, existem, e todos sabem disso, certas tendências ideológicas que são contra; não é ser contra, mas não valorizam, desconstroem. A igreja é a favor da vida, é contra o aborto, não coaduna com o casamento homoafetivo. São valores que a igreja defende e que nosso povo cobra dos nossos parlamentares para defender essas bandeiras. Mas em resumo, é o direito de existir, de viver plenamente, sem sermos cerceados no nosso direito.
O evangélico tende sempre a seguir a liderança religiosa?
A realidade dos fatos comprova isto; nem todos seguem, mas a tendência da maioria é seguir a orientação, porque o líder religioso tem a responsabilidade de orientar, não é determinar. Eu não mando no voto e acho que nenhum líder religioso pode mandar no voto de ninguém, as pessoas são livres, mas a orientação sobre o que é melhor para o nosso segmento no país, nós orientamos e a tendência da maioria é de seguir a orientação do líder religioso.
O voto do evangélico é sempre conservador?
É, por ser mais conservador, mas não posso dizer que todo voto evangélico sempre foi conservador. O atual governo tem práticas ideológicas que contrariam o cristianismo, mas no passado já vi evangélicos apoiando o governo de esquerda, em razão das alianças e dos acordos que se fazem, e de certa forma, o governo até respeitou mesmo.
O voto evangélico é sempre de direita, no aspecto económico?
Também, não queremos nunca um estado grande. Tememos muito essa ideologia marxista. Na economia, a tendência é esse voto mais de direita, em função de sermos contra um estado grande, um estado gigante. A livre iniciativa, a economia tem que ter a sua liberdade existir, e esse é um pensamento dos evangélicos.
A maioria dos evangélicos é bolsonarista?
Essa é uma pergunta difícil de responder, se é a maioria, porque geralmente essas militâncias extremadas de direita e de esquerda fazem muito barulho. Mas penso que os evangélicos, na sua maioria, são conservadores, tradicionais, mais de centro. Difícil dar uma resposta se a maioria dos evangélicos é bolsonarista, mas parece que é; a impressão que se tem é essa.
No grupo evangélico do senhor, a maioria é bolsonarista?
É, acaba sendo mesmo.
A pauta de costumes, que prevaleceu na eleição passada, deve ter o mesmo peso nas eleições municipais?
Eu não vejo isto. É bem verdade que a leitura que fazemos é a seguinte: não tem 2026 sem 2024. Pode ser que em 2026 essa pauta de costume volte a ser discutida, mas eu vejo, por exemplo, independentemente de religião e de costumes, a discussão nos municípios voltada aos problemas do município mesmo, sem nacionalizar a eleição. Em Goiânia eu não vejo esse debate, em Anápolis não vejo esse debate; vejo eles colocando na pauta as necessidades urgentes que a cidade tem. Há uma. Imagino que possa ter pelo menos um pequeno número de pessoas que ainda vota no município em função dessa pauta de costumes, mas não é isso que prevalece.
Como a Assembleia de Deus vê a proximidade da vereadora Aava Santiago com o PT e com o presidente Lula?
Ela fala por ela própria e não representa o segmento. Eu acho que o governo às vezes fica querendo isolar a liderança,os pastores que realmente têm proeminências sobre o rebanho e começa a construir essas coisas paralelas assim. Ela é uma boa moça, não tenho nada contra ela, contra o testemunho dela, mas não acredito que tenha uma palavra abalizada, que fala pelos evangélicos e que o conselho dela vai chegar em algum lugar para o presidente Lula.
Qual o peso do voto evangélico na capital, em Anápolis e em Aparecida de Goiânia?
Eu penso que o voto evangélico é muito decisivo. O evangélico, a igreja evangélica, o segmento evangélico não tem força para eleger um prefeito em Goiânia, Anápolis e Aparecida, mas para onde pender, a tendência sendo para um lado, ele faz toda a diferença mesmo. Acho que o mundo político todo reconhece essa força.
Seria o fiel da balança?
É esta a palavra certa, o fiel da balança.
Anápolis é a cidade mais evangélica do estado?
Sim, é considerada a cidade que tem o maior percentual evangélico, proporcionalmente, do Brasil. Mas hoje Aparecida disputa com Anápolis também.
Em Anápolis, há duas candidaturas consideradas de direita, a apoiada pelo prefeito Roberto Naves, Eerizânia Freitas (UB), e a do Márcio Correa (PL). Como o senhor vê esse cenário?
Eu queria que fosse o outro Márcio, o Márcio Cândido, e nos frustramos. A igreja de Anápolis até hoje não tomou uma posição em razão da frustração do não emplacamento do nome do Márcio Cândido, que é vice-prefeito por quase oito anos, era o nome que vinha sendo trabalhado pelo nosso segmento, mas a questão partidária inviabilizou. As alianças que se fazem nacionalmente e no estado acabaram por inviabilizar o Márcio. E em razão dessa desconstrução que houve, é certo que a maioria dos evangélicos – embora não haja uma coisa oficial, uma convenção ou que a igreja de Madureira e a Assembleia de Deus tenham feito essa declaração de voto para Eerizânia – a tendência natural é essa por ela pertencer ao segmento.
A tendência em Anápolis é apoiar a Eerizânia?
Exatamente.
A divisão da direita não favorece o candidato do PT?
Com certeza. Anápolis é uma cidade de segundo turno, acho que ninguém leva isso em primeiro turno em Anápolis. Segundo turno, todos de ideologia de centro e de direita vão estar unidos.
Em quais outras cidades o voto evangélico deve ter influência decisiva?
Eu vejo que em muitas cidades. Tenho andado pelo estado e na maioria das cidades,ou tem uma candidatura a prefeito que nasce dentro da própria igreja ou um membro da igreja é convidado para ser o vice-prefeito. Em muitas cidades há uma certa aliança; se o candidato é católico, lança um evangélico na vice; se o candidato a prefeito é evangélico, lança um católico na vice. Aí se vê que a Influência é muito grande em Formosa, Iporá, São Luís dos Montes Belos, Ceres, que tem um segmento muito forte, Porangatu, Minaçu, em várias cidades em que o voto evangélico é decisivo também.
Como o senhor viu a troca de candidatos em Aparecida de Goiânia? O senhor acha que era necessária?
Pois então, é algo difícil de dizer. Eu parto do princípio que a força do governador, ele é bem avaliado em Aparecida de Goiânia, e a força do Gustavo Mendanha conseguiria reverter aquela situação do Vilmar (Mariano), mas eles deram um prazo para ele se viabilizar e ele não cresceu nas pesquisas o tanto quanto se pretendia, e o governo tomou, quer dizer, a base do governo em Aparecida tomou a decisão de trocar o Vilmar. Eu imagino que se tivesse mantido, ele poderia ter sucesso, mas a circunstância atual, imagino que o nome do Leandro (Vilela), que traz o recall do Maguito Vilela, já está se despontando. O que vai revelar se foi certo ou não é exatamente essa campanha agora, o nome dele decolar, crescer, porque ninguém pode prever o futuro. De qualquer maneira, acho que deve ter unidade da base do governador, embora o Vilmar tenha ficado muito ferido, porque, é claro, tinha uma expectativa muito grande e isso inviabilizou o projeto político dele. Mas esse grupo, se mantendo unido, vai-se comprovar que a decisão foi certa em relação ao nome de Leandro.
O deputado João Campos está sendo cotado para ser vice do Leandro em Aparecida?
O nome dele surge com grandes possibilidades, com muita força. Ele sempre foi de Aparecida, foi delegado de polícia lá muitos anos, morou em Aparecida, é de lá mesmo. A votação expressiva que teve para o Senado, aliás, foi o senador mais bem votado em Aparecida na eleição passada, o nome dele tem peso lá e o partido ao qual ele pertence, o Podemos, que é liderado pelo deputado federal Glaustin da Fokus, tem muita influência em Aparecida também. A indicação do nome dele agrada muito aos evangélicos.
O senhor participa das definições do Podemos?
Meu irmão é o presidente estadual (Eurípedes do Carmo) e, eventualmente, sou consultado, mas eu não exerço militância partidária. Eu trato mais quando é um assunto de interesse da igreja, quando me consultam, é mais esse campo mesmo.
Os evangélicos almejam participar da chapa majoritária da base do governador Ronaldo Caiado em Goiânia? O senhor é muito próximo do Caiado, poderia facilitar a indicação?
Não há essa discussão colocada ainda. Eu vejo que Sandro Mabel tem muitas dificuldades pelos vários interesses de gente que quer figurar na chapa dele, são muitas forças que querem esse espaço. Não há essa coisa colocada (ser vice) dos evangélicos no pleito de Goiânia.
A quem caberá indicar, na opinião do senhor? Seria legítimo o deputado Bruno Peixoto (UB) indicar?
O Bruno está com muita força, ele tem um grupo, mas sabemos que, por exemplo, se eventualmente houver uma composição com o Vanderlan (Cardoso), acho muito difícil, porque ele (o governador) acata a indicação do Vanderlan com o vice; se o PL resolver compor com a chapa, o vice deve sair de lá. Essa discussão está muito incipiente. Não houve um convite ainda do Mabel ou do governador para trabalhar um nome evangélico. Essa proximidade com o governador tenho há muitos anos, desde a candidatura ao Senado, meu irmão foi suplente dele, isso nos aproximou muito; e ele é muito respeitoso com o segmento e conosco. Se ele nos procurar, se houver a possibilidade lá na frente, nós realmente temos quadros.
O ex-senador Luiz do Carmo já foi cotado para ser vice na chapa da base do governador. A igreja ainda trabalha com essa possibilidade?
Para ser sincero, eu não tenho porque não dizer a verdade, nunca fui consultado sobre a vice de Goiânia. Mas seria um bom nome, foi deputado estadual por dois mandatos, cumpriu um mandato de senador por mais de quatro anos, é uma pessoa que está militando. Não sei se ele tem esse interesse, nunca discutimos em família sobre essa possibilidade, mas caso a coisa caminhe nesta direção, é um dos nomes que nós temos, como temos também o Rafael Gouveia, meu genro, deputado estadual Henrique César, a vereador Lea Klebia.
Em quantas eleições a Assembleia de Deus deve participar, seja com candidato a prefeito ou a vice, e quantos vereadores pensa em eleger?
Eu fico devendo esse dado, porque nós estamos trabalhando essa questão ainda; sei que em muitos municípios o Podemos, através do Glaustin, do Luiz Carlos, do Eurípedes, do Henrique César estão construindo essas candidaturas, mas eu não tenho números. Eu sei que vai ser algo expressivo, porque não é só o Podemos, temos outras vertentes evangélicas que também trabalham nesse sentido.
Tem alguma cidade que é prioridade para a Assembleia de Deus?
Sim, além do interesse que temos na grande Goiânia, Senador Canedo, São Luís Montes Belos, Iporá, temos grande interesse em Minaçu e em muitas cidades de porte médio.
Qual o projeto da igreja para 2026?
Está longe 2026. Eu quero trabalhar (a eleição de) 2024 para ver a força que vamos chegar em 2026. É claro que queremos preservar o espaço que temos e até aumentar, porque temos sempre a pretensão de aumentar o número de evangélicos na Câmara e no Senado.