A maior conversa fiada inventada no mundo todo foi que o Papai Noel vem do Polo Norte. Pois é mais que óbvio que não. Com aquele solavanco da carroça na estrada de chão e o cheiro de pequi subindo no ar, todo goiano sabe que o bom velhinho veio do Cerrado. E não me venha falar de trenó, porque, por aqui, quem puxa a carroça encantada não são renas — é o Zé Guará, o lobo dos mais conhecidos dessas bandas.
De barba branca manchada de farinha de milho e barriga grande de tanto comer pamonha e empadão, Papai Noel goiano é diferente. Ele não veste veludo vermelho; usa um macacão surrado, chapéu de palha e sandália de couro que faz “pléc-pléc” quando anda. Na noite de Natal, o barulho dos sinos não vem do céu — vem dos arreios de uma carroça puxada por burros que tilintam bonito enquanto cruzam a mata seca.
O saco do Papai Noel goiano, claro, não é de brinquedo importado. Tem galinhada, pamonha, doce de leite da Cidade de Goiás e até uns pacotinhos de queijo caipira embrulhados na folha de bananeira. Quem deixa leite e biscoito para ele na janela perde tempo: o bom velhinho só para se tiver um prato de arroz com pequi caprichado e um bilhete dizendo: “Pode pegar sem dó, que foi feito com fartura!”.
E as crianças? Ah, essas ficam espiando na janela, porque todo mundo quer ver o Zé Guará. Dizem que, quando ele passa, até a poeira brilha no ar. E o velhinho, com aquele sotaque arrastado, sempre solta um “É bom demais da conta, sô!” antes de seguir viagem.
Naquela noite, o Cerrado todo ganha luz. As estrelas parecem chegar mais perto, brilhando feito pisca-pisca no céu. Papai Noel estende a rede entre dois pés de pequizeiro, olha para cima e suspira: “Cerrado é onde o Natal nasceu, mas o povo é que esqueceu.” Então, da próxima vez que te falarem de neve e trenó, sorria. Porque aqui, entre o cheiro de mato, o gosto de pamonha e o tilintar dos sinos de um Natal que tem sotaque goiano. E isso, meu amigo, é um milagre que só o Cerrado conhece.